quarta-feira, 31 de agosto de 2011

O Corsário Apaixonado - Capítulo VIII(segunda parte)


Aquele balanço interminável estava fazendo com que o seu enjoo voltasse. Foi até o armário e pegou um pouco de gengibre para mastigar. Fazendo uma careta ao sentir o gosto acre da raiz, voltou seu olhar para cima da cama. Os tremores haviam cedido e ela conseguira fazer com que ele bebesse todo o chá. Os suores, sinal de que a febre estava sendo vencida, abundavam sobre a testa e o peito de Crow, começando a deixar os lençóis úmidos. Precisava trocá-los. Abriu o baú e imaginou se eles haviam atacado algum navio que transportava o enxoval de uma rainha ou nobre francesa, pois os jogos de cama que ali encontrou eram todos de grande qualidade, ornados com rendas finas e bordados feitos com fios de seda coloridos formando flores e borboletas. Foi uma pena ter que destruir um deles para fazer as ataduras, mas tinha sido por uma boa causa.
Atordoado e sentindo dores no corpo, abriu os olhos e viu Ana debruçada sobre o baú aos pés da cama. Pensou que estava sonhando. Só então notou que estava deitado em sua cama, nu da cintura para cima, com compressas sobre a testa e o corpo. Ela estava cuidando dele? Observou a face de traços suaves, realçada pela chama flamejante do lampião, compenetrada, a procura de alguma coisa. Estava com os cabelos presos por uma fita, tornando tentadora a visão de seu delgado pescoço. Parecia perdida dentro da camisa masculina. Seus movimentos eram de uma extrema sensualidade. Viu quando ela decidiu o que pegar dentro do baú e fechá-lo sem ruído. Fechou os olhos para fazê-la pensar que ainda estava dormindo. Tinha medo que aquele encantamento se desvanecesse e ela o deixasse.
- Bem, meu belo corsário, como faremos para trocar esses lençóis? – indagou olhando-o docemente, aliviada por seus cuidados estarem tendo efeito. Esperava que a febre não voltasse mais. Certamente o emplastro do Liam e o chá de Brett tinham ajudado bastante na melhora.
Uma onda mais forte avançou subitamente à estibordo, lançando-a sobre a cama, fazendo-a cair sobre o peito de Crow. Soltou uma interjeição picante e, enquanto tentava levantar-se e recuperar o equilíbrio, lançou um olhar preocupado para o local do ferimento, temendo poder tê-lo machucado na queda. Porém, no caminho, seus olhos cruzaram com certo par de olhos verdes, que agora corriam por seu rosto. A proximidade entre eles era tal que ela pode sentir o calor da respiração do pirata, o que provocou um imediato descompasso de seu coração.
- Perdão! Eu o machuquei? – perguntou com a voz trêmula.
- Não... – respondeu ele tentando ler o que havia por trás daqueles olhos de avelã. – Por um momento, pensei que... – ... estava no céu, disse para si mesmo.
- Desculpe... – disse desajeitada e com as faces queimando. – Estamos enfrentando outra tempestade e o navio está balançando demais...
Apesar de suas tentativas em levantar-se, a cada vez uma nova onda a empurrava de volta e seu corpo não ajudava muito, já que seus ossos pareciam ter virado manteiga.
- Eu gostaria de ajudá-la a ficar de pé, mas parece que meu corpo não está colaborando. – desculpou-se. 
Queria sentar, mas não encontrava força suficiente para tal, além de perceber alguma coisa grudada em seu ombro ferido.
- O que aconteceu?
Finalmente ela conseguiu sentar-se na beira do leito. Evitando aquele olhar, pegou a compressa que caíra ao lado do travesseiro e iniciou uma rápida explicação.
- Você estava com febre muito alta, com tremores e gemendo muito. O Brett o trouxe para cá e mandou preparar um chá com um tipo de casca. O Liam fez um cataplasma para por sobre seu corte...
- E você?
- Eu?... Coloquei compressas frias para ver se a febre baixava... Pelo visto tudo isso resolveu...
- Obrigado... Não precisava ter se incomodado comigo...
Subitamente uma onda de indignação tomou conta dela. O cansaço, a falta de sono e o temor da morte que rondara aquele quarto durante toda a noite eclodiram ao ouvir aquelas palavras. Levantou da cama quase de um pulo e voltou-se para ele com a boca crispada e a expressão em fúria.
- Não diga uma coisa dessas! Pelo o quê me julgas? Acha que eu ficaria parada olhando você, febril e gemente, e não faria nada? Acha que tenho um coração de pedra e que, depois de ter a minha vida salva por você, o deixaria morrer na minha frente sem fazer nada? Se não fosse tão teimoso e obedecesse a ordem de ficar em repouso, não estaria aqui agora – Parou de gritar quando ele sorriu. Só então notou que alterara o tom de sua voz exageradamente. Calou-se constrangida e deu um longo suspiro, colocando a mão no peito. Por que ele a fazia sentir daquele jeito? Seria possível que ele não acreditasse que ela fosse capaz de fazer algo por ele apenas pelo fato de... de preocupar-se com ele... de gostar dele...
- Apenas queria agradecer... – disse ainda não refeito da explosão de Ana.
- É que você me deixa... – As palavras ficaram perdidas em sua boca e seus sentidos perdidos nos olhos de Crow.
Mais uma rajada de vento forte, uma ondulação mais violenta, e ela caiu sobre a cama, com as mãos espalmadas na beirada, para evitar cair de joelhos. Entretanto a cabeça acabou sobre o peito de Crow. Sem se importar com a dor no ombro e antes que ela conseguisse levantar-se, envolveu-a com o braço direito e a manteve junto a si.
- Como eu a deixo?... – falou junto ao seu ouvido.
- Me deixa... nervosa... – ciciou de olhos fechados, arrepiando-se com a calidez da respiração de Crow em sua pele.
Aspirou o perfume das mechas de cabelos ruivos que se soltavam do laço de fita e roçou os lábios no lóbulo da orelha tenra e delicada. Ouviu a respiração de Ana acelerar, confundindo-se com a sua própria. Sentiu o calor do seu rubor nas maçãs do rosto, quando trilhava com beijos suaves em direção a boca tentadora. Quando ali chegou ela o aguardava, ansiosa e entreaberta, pronta para recebê-lo. O desejo de beijá-la era mais forte que qualquer outro tipo de sentimento de culpa ou pudores que ainda pudessem existir. Ela o cativara completamente. Corpo e alma. Precisava daquela mulher como o ar que respirava. Lentamente ela acomodou-se lânguida ao lado dele, lançando o braço esquerdo em torno de seu tórax nu enquanto o beijava, embriagada pela saliva e pela língua que a invadia exploradora e insaciável. Quando as bocas separaram-se, os corpos não seguiram a mesma direção. Ficaram ali abraçados, inebriados pelo acalentador mormaço que exalava da união de seus corpos.
- Tive medo que morresse...
- Não posso morrer antes de cumprir a minha missão.
- Que missão? – indagou sonolenta.
- Devolvê-la a sua família.
- Minha família?... Eu a perdi há muitos anos.
Ela o sentiu retesar-se e apressou-se a acalmá-lo.
- Não foi sua culpa. O único culpado foi aquele monstro do Drake que comandava o navio.
Ele permaneceu mudo enquanto ela o acariciava no peito, brincando com alguns dos pelos negros que o cobriam sem exagero.
- Eu podia ter feito alguma coisa para impedir... Devia tê-lo matado... – Enquanto falava algo passou por sua mente e afastou-a delicadamente, obrigando-a a encará-lo – Por que você acha que eu não tenho culpa?
- Ora... – Desviou o olhar lembrando que Brett lhe pedira que não o delatasse – Ora, por que não! – E tentou levantar-se, mas foi segura por Crow.
- O que o abelhudo do Brett andou fofocando no seu ouvido enquanto eu estava inconsciente?
- Ele não disse nada...
- Depois eu me entendo com ele...
- Não vai brigar com ele. Brett é seu amigo. Ele apenas disse que você enfrentou Drake e foi contra o que aconteceu.
Chegou a sentir uma pontada de ciúmes ao ouvi-la defender o amigo.
- E você acredita em tudo que os outros dizem?
Então foi a vez dela o encarar.
- Acredito no que o meu coração me diz. E ele me diz que você é bom.
- Já fiz muitas coisas ruins na minha vida, Ana. Coisas nada agradáveis... Afinal sou um pirata... – e contraiu os lábios ironicamente – Você já viu um pirata de boa índole?
- Humm... – ela fez que meditava sobre a questão – Na verdade...Você é o primeiro.
Ele gargalhou alto, mas o riso foi suprimido pela dor no ferimento. Preocupada, Ana sentou ao seu lado.
- Ai, meu Deus! Você tem que descansar. A febre pode voltar e eu não quero estragar mais um daqueles lindos lençóis que estão no baú para fazer compressas e ataduras.
- Só se me der mais um beijo... Acho que seus beijos podem me fazer curar mais depressa.
Ela arqueou a sobrancelha esquerda, simulando dúvida quanto ao seu pedido.
- Um beijo curativo?
- Só um... – rogou ele com o olhar.
- Um só...
Ao ver a expressão de satisfação iluminando a face de Crow foi de encontro àqueles lábios que tinham o poder de fazê-la esquecer de todo um passado de sofrimentos. Sim... Aquele beijo tinha o poder de cura. O poder de curar as feridas de sua alma.
- Por que não se deita aqui ao meu lado? – perguntou assim que se separaram. – Prometo que não vou tentar nada...
- Você  precisa de repouso... – falou bem baixinho, cobrindo as faces de rosa – Comporte-se... Ainda temos que trocar esse lençol, Sr. Nigel. - desconversou. 
Com a colaboração dele, rapidamente a roupa de cama foi substituída por outra, seca e limpa. O balanço do navio diminuíra. As pálpebras de Ana tornavam-se pesadas e o corpo exigia repouso. Sentou-se na cadeira a observá-lo.
- Venha... Deite-se aqui. – repetiu o convite. – Você também precisa descansar. A cama é grande o suficiente para nós dois.
- Está bem... – acabou por ceder, por achar que a cadeira onde estava não era muito convidativa para um cochilo.
Antes de deitar, conferiu com a palma da mão sobre sua testa que a febre realmente se fora. Ele achou graça quando ela cobriu a ele e à cama com uma manta e deitou-se sobre ela, limitando o contato entre seus corpos. Parecia tensa e ele não quis forçar maior aproximação. Aos poucos ela se virou de lado, ficando de frente para ele.
- Logo chegaremos a Eleuthera. – Crow começou a falar em voz baixa e mansa – Você vai gostar de lá. Depois cuidaremos do seu retorno à Inglaterra... E não pense que esqueci seu tio espanhol e os motivos de você não querer revê-lo. Ainda está me devendo uma explicação. – Então ele ouviu um suspiro tímido e a olhou. Ana estava de olhos fechados e a respiração calma e ritmada mostrava que caira em sono profundo. Uma sensação de rara felicidade inundou seu espírito. Sentia-se completo como nunca se sentira antes. No entanto, enquanto velava o sono de Ana, a expressão de júbilo foi sendo desgastada por incertezas. Dúvidas quanto ao futuro o perturbavam. Se dependesse dele, Ana seria reconhecida como uma rica herdeira. Viveria na corte, cercada de regalias, onde teria a chance de escolher um homem nobre e poderoso para casar. Quanto a ele, seu destino havia sido traçado quando escolheu a deserção e uma vida em alto-mar, como um fora da lei. Não tinha nada a oferecer a ela a não ser uma vida de pilhagens e o convívio com larápios da pior espécie. Fechou os olhos e resolveu adiar esses nebulosos pensamentos para adiante.

(continua...)


Oi, meus queridos! 
Nunca pensei que fosse ser tão difícil colocar em palavras e ações o acerto inicial desses dois, mas enfim aí está. Espero que tenham gostado. Agora, não pensem que as complicaçoes acabam por aí. Infelizmente, essa história está só começando. Tomara que eu consiga escrever tudo que rola na minha cabeça sobre esse pobre casal e que voces tenham paciencia para aguentar esse romance até o fim...rsrsrs. Como sempre, adorei os comentários feitos e pela solidariedade de todos com relação às minhas dificuldades, que graças a Deus já foram resolvidas. Agora, tenho que correr para escrever o capítulo nove.
Beijos e carinhos a todos!

sábado, 27 de agosto de 2011

O Corsário Apaixonado - Capítulo VIII (primeira parte)

Apesar de ainda sentir-se um pouco fraco, devido ao ferimento e a perda de sangue, e do desejo de permanecer ao lado de Ana, que se mostrara tão cuidadosa e afável com ele, Crow voltou ao convés acompanhando Brett a fim de verificar os estragos feitos pela tempestade. Graças aos marujos experientes e ao comando de Brett, o Highlander conseguira contornar o ciclone e sair sem maiores danos, além do mastro secundário, conforme ele pode observar após sua avaliação. Os reparos necessários poderiam ser feitos durante a navegação, que continuaria rumo a Eleuthera.
- Crow, agora que já fez a sua vistoria, espero que crie um pouco de juízo, volte para a cabine e vá descansar.
- Eu estou bem, Brett. Além disso, você sabe que essa região é propensa a mudanças climáticas bruscas. Nada garante que estamos livres de outro ciclone ou de uma tempestade.
- Por isso mesmo. Quero que esteja bem saudável caso tenhamos que enfrentar outro probleminha como esse que passou. Principalmente tendo a sua disposição uma bela moça para cuidar de seu ferimento.
- Ela apenas ficou agradecida pelo que fiz hoje.
- Você realmente está gostando dela...
- Não seja ridículo. - Que outro motivo teria para inventar tantas desculpas para fugir dela?
- Tenho mais com o que me preocupar do que fugir de uma mulher, Brett.
- Meu amigo... Não é de uma mulher qualquer. É dessa mulher.
- Me deixe em paz, Brett.
Virou-se bruscamente, para evitar as argumentações de seu imediato e reconhecer que ele não estava muito longe da verdade, e sentiu a dor aguda voltar ao ombro, o que provocou uma imprecação quase inaudível.


Naquela noite ele continuou se recusando a dormir na cabine e compartilhar o mesmo espaço com Ana. Apesar de Brett lembrar que os homens já sabiam que ela estava bem, Crow disse que não queria impor sua presença a ela e criar-lhe alguma situação constrangedora. Contudo, no início da madrugada, Crow começou a gemer, chamando a atenção de Brett que dormia em outra rede próxima, no espaço que dividiam no porão do navio. Ardia em febre, o que podia ser um mau sinal, que demonstrava que o ferimento não estava cicatrizando adequadamente. Ele não podia continuar ali naquele ambiente insalubre e deitado numa rede. Precisava de uma cama e de cuidados.

Acordou sobressaltada ao ouvir a batida forte. Didier fez um muxoxo e virou-se em seu leito improvisado no chão. Havia bebido todo o rum que sobrara do tratamento de Crow. Ana pegou uma faca que ficara na bandeja do jantar e caminhou cautelosamente até a porta.
- Ana! Por favor, abra a porta! É o Brett!
- O que quer? – perguntou intrigada com a causa de uma visita àquela hora da noite.
- É o Crow. Ele não está bem.
Imediatamente a porta se abriu e o rosto atônito de Ana apareceu na penumbra. A aflição só surgiu quando colocou os olhos sobre o homem que tinha sido trazido numa espécie de maca por outros dois marujos.
- Entrem! – mandou, afastando-se do caminho.
Quando eles fizeram menção de deixá-lo no chão, ela imediatamente interferiu.
- Levem-no para a cama!
- Ele está com febre... – explicou Brett.
- O que é que está acontecendo por aqui? – reclamou Didier, recém acordado, com fala enrolada.
- Brett, consiga mais água para fazer compressas. – Ignorou a interrogação e continuou a falar com o imediato – Uma vez eu vi uma parteira fazer isso numa mulher que estava febril. Sabe se há alguma erva naquele armário que possa ser usada para baixar a febre? – perguntou após elevar a luz da lamparina para poder avaliar melhor seu "paciente".
Surpreso com a desenvoltura e preocupação da garota, Brett lembrou que Crow costumava usar uma infusão de casca do salgueiro para tratar as febres que por ventura ocorriam entre a tripulação ou no abrigo em Eleuthera. Correu até o armário e lá descobriu o frasco de vidro que continha a preciosa erva.
- Vá até o Liam e diga que prepare uma infusão com um pouco disso. – ordenou a um dos homens que o acompanhara até ali. – Diga que o capitão está com febre. Vá... Rápido!
Enquanto isso, Ana já havia retirado as botas de Crow e tentava deixá-lo o mais confortável possível sobre a cama. Sem se dar conta que passara a ser observada, usou o que sobrara do lençol rasgado à tarde para fazer compressas. Umedeceu uma delas com água e colocou sobre a testa de Crow, como vira fazer antes, conforme explicara para Brett.
- Ei! O que ele está fazendo deitado aí? – perguntou Didier indignado, que acabara de levantar e foi verificar o que estava ocorrendo por conta própria.
- Venha, meu velho. Tenho um local ótimo para você curar a sua bebedeira. 
- É?... Onde?
- Lá no convés. Nada como a brisa marinha para deixá-lo mais alerta.
- Não vou a lugar algum com você, seu lambe-botas.
- É melhor sair daqui, Didier. O capitão não está bem... – disse Ana.
- E desde quando você virou ama-seca de pirata?
- Leve-o daqui, Brett, por favor.
- Volto assim que possível... Vamos lá, homens. Vamos deixar a moça cuidar do capitão.
Quando se viu sozinha com Crow, passou-lhe pela cabeça que deveria verificar como estava o ferimento. Ele não fizera o descanso recomendado por Liam. Teimoso, pensou. Com algum esforço, conseguiu deitá-lo sobre o lado direito e baixar a camisa para expor o ombro ferido, o que provocou um gemido gutural. Tirou a atadura que tinha colocado horas antes e viu com apreensão uma área de pele avermelhada em torno do trabalho de costura de Liam. Não sabia o que fazer diante aquilo. Devia ser a tal infecção da qual o cozinheiro havia falado. Talvez devesse lavar com água novamente, fechar o curativo e... Rezar. Nunca mais tinha feito isso... Rezar. A última vez em que se lembrava de ter orado a Deus foi quando estava naquele bote horrível, no meio do nada, perdida no mar, junto a sua mãe. Depois de sua morte, a revolta por ter perdido toda sua família praticamente de uma vez só foi grande demais para voltar a pensar em Deus como um consolo. Agora, ali estava a sós com aquele homem, a quem devia temer, mas por quem nutria admiração e ...ternura. Nunca mais, depois de perder seus pais, tinha sido protegida por alguém. Didier não era o que se podia chamar de protetor. No entanto, Crow a salvara naquela tarde sem titubear e agora poderia morrer por sua causa. Seus pensamentos foram interrompidos quando Brett entrou trazendo uma caneca com chá, uma nova jarra com água fria e uma espécie de pasta quente envolvida em um tecido poroso.
- Como ele está?
- Na mesma... – Ela notou a estranheza no olhar de Brett ao verificar a posição de Crow na cama. – Estava olhando o ferimento e acho que não está com bom aspecto. Vou limpar e refazer o curativo.
- Talvez tenha razão. Deve ser isso que está provocando a febre. Liam mandou uma espécie de emplastro aquecido para colocar sobre a ferida. Acho que ele já esperava alguma reação desse tipo.
Ana passou à ação. Com delicadeza executou a limpeza do corte, colocou o emplastro e voltou a fechar com ataduras limpas. Logo após terminar, quase sem perceber, passou os dedos sobre as cicatrizes nas costas de Crow como se as estudasse com o tato. Só então o acomodou sobre o leito e trocou as compressas de água fria. Ele passou a tremer e bater o queixo. Brett buscou uma coberta e jogou-a sobre o amigo.
- Ele está piorando...
- Vou tentar fazê-lo beber o chá... – Colocou a infusão em uma caneca, enquanto Brett elevava a cabeça de Crow acima do travesseiro.
Certificou-se que o líquido não estava quente demais e levou a caneca aos seus lábios. Um pouco escorreu pela barba e ele abriu os olhos por alguns instantes. Como se mergulhasse em mar aberto, Ana teve vontade de beijá-lo. Engoliu em seco e lutou para encontrar sua voz.
- Beba, Nigel... Vai lhe fazer bem... – insistiu, tocando com a beirada da caneca em seus lábios trêmulos. Conseguiu que ele ingerisse um pouco do chá. - Tente beber mais um pouquinho...
Ele bebeu, mas logo em seguida fechou os olhos e continuou com os calafrios. Aparentemente a febre continuava subindo. Ele voltara a ficar inconsciente.
- Talvez devessemos colocar mais compressas pelo corpo. – sugeriu Brett.
- Acho que sim... Ana correu a preparar novas bandagens umedecidas na água fria, enquanto Brett terminava de tirar a camisa de Crow. Colocaram-nas sob suas axilas e no abdômen, além da testa. Os tremores ainda duraram vários minutos. Quando Crow pareceu estar mais relaxado, Brett sentou em uma cadeira com expressão cansada.
- Acho que você devia descansar. Precisará continuar no comando do Highlander até ele se recuperar e, por isso tem que estar alerta. Pode deixar que eu cuido dele. – disse enquanto tentava fazer Crow bebericar mais um pouco da infusão.
- Vou esperar mais um pouco e depois seguirei o seu conselho. – esboçou um sorriso abatido e esticou as pernas adiante.
Brett acabou por cochilar alguns minutos, enquanto Ana tentava baixar a febre de Crow. Foi então que o navio começou mais uma vez a balançar sobre a agitação das ondas. A luminosidade dos raios passou a sobrepor-se à luz fraca da lamparina e o rugido dos trovões começou a ficar cada vez mais próximo. A porta foi aberta repentinamente e Bald entrou em passos rápidos. Nem parecia que acabara de beber metade de uma garrafa, pois sua expressão era bastante lúcida e as palavras saíram de sua boca claramente.
- Brett, parece que vamos ter problemas de novo!
Antes que Ana precisasse chamá-lo ele já estava de pé, pronto para sair atrás de Bald.
- Estarei no convés, caso precise de algo.
- Só preciso que mantenha esse navio sobre a água. – pediu Ana nervosa.
- É o que faremos, milady – deu um sorrisinho desanimado e foi em direção à saída. – Vamos lá, Bald! Depois do ciclone de hoje à tarde, não vai ser uma chuvinha à toa que vai nos derrubar.
- E o Crow?... – Bald perguntou evidentemente preocupado. A porta se fechou e restou apenas o murmúrio de suas vozes subindo as escadas em direção ao convés.


(continua...)


Meus queridos leitores, hoje acabei postando só a metade do capítulo 8, pois tive alguns problemas pessoais essa semana e não tive a inspiração necessária para escrever tudo que desejava. Assim, deixo aqui a primeira metade, promentendo muito breve espero postar o restante. Também aproveito para apresentar a nova capa do ERIK, que pode ser vista lá no alto da página. Considerem como uma segunda edição. Espero que gostem. Quero agradecer mais uma vez às comentaristas Brih, Aline, Vanessa ( muito bom te ver de novo por aqui, querida!) e  Léia. À Denise, que ainda não conheço, mas que deixou um recado querendo saber onde poderia comprar o livro do Corsário, minhas boas vindas ao blog.
Agora uma sessão de atualização sobre o Erik, além da capa nova. O Booktour realizado pelo Blog Doce Encanto, da minha amiga Raphaela já gerou mais duas resenhas. Deixo aqui o link para que possam ler. Inclusive, vocês entenderão o porque da troca da capa. http://www.skoob.com.br/livro/resenhas/153071
Aqui me despeço. Até muito breve com a segunda parte desse capítulo.
Beijos carinhosos!

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O Corsário Apaixonado - Capítulo VII


Crow não voltara a dormir na cabine. Em seu lugar, permitira que Didier dividisse o espaço com Ana, não sem antes dar-lhe claras instruções de como deveria portar-se e protegê-la. Para a tripulação espalhou o boato de que ela estava adoentada, apresentando uma febre desconhecida e provavelmente contagiosa. Com isso esperava continuar protegendo-a contra marujos curiosos e sedentos de calor feminino. Ela ficou proibida de passear no convés, para dar veracidade aos boatos de que estava doente. Agora, na maioria das vezes, era Didier que levava suas refeições, das quais participava muito satisfeito. Pelo menos tinha uma mesa onde comer e uma comida que era, sem sombra de dúvidas, muito melhor que aquela que dividia com piratas malcheirosos nos porões ou no convés. Por sua vez, Ana não ousou antepor-se a tais ordens, visto que imaginava os prováveis motivos de Crow. Ela mesma ainda enfrentava a angústia que lhe causava saber que ele fazia parte de seu doloroso passado. Não conseguia odiá-lo, optando por evitar que seus pensamentos pertencessem a ele. Nem sempre conseguia seu intento, principalmente à noite, onde o silêncio era substituído pelos roncos de Didier vindos do chão do gabinete. O que antigamente não a perturbava, agora era motivo para horas de insônia, a pensar em quem não devia.
Passados três dias, Brett apareceu para servir seu desjejum. Como sempre discreto, tinha um ar amigável e jamais fazia qualquer insinuação a respeito dela ou de sua relação com Crow. Provavelmente ele também fora avisado que a única mulher a bordo era de propriedade do capitão e, por isso, a consideração evidente que dispensava a ela. Cumprimentava, perguntava se desejava mais alguma coisa e saía. Entretanto, Ana já intuíra que entre o imediato e Crow havia uma amizade que ia além das necessidades de bom relacionamento hierárquico no navio pirata. Sentindo uma carência súbita por mais informações a respeito do comandante do Highlander resolveu arriscar-se e, tentando ser o mais casual possível, iniciou uma conversa com Brett.
- Há quanto tempo navega neste navio, senhor Brett?
Apesar de ligeiramente surpreso com a indagação, arqueou as sobrancelhas, como se calculasse mentalmente o número de anos a serviço da pirataria. Intimamente, sorria imaginando quantas perguntas mais seriam necessárias para que ela citasse o nome de Crow. Com o conhecimento que tinha das mulheres, jurava que ela não resistiria mais que três.
- Só nesse navio, milady, devo completar nove anos no próximo mês. – Lá se foi a primeira.
- Posso saber por que se tornou um pirata?  
Colocou a mão no queixo, olhou para cima e estreitou os olhos a pensar na melhor maneira de responder.
- Poderia dizer que foi o desejo de liberdade, ou talvez o gosto pela aventura... Ou quem sabe pelos mesmos motivos que levaram a senhorita a se tornar uma ladra... – observou Ana ruborizar diante de sua alegação e completou, em defesa de ambos – Por pura falta de opção. – Foi-se a segunda... Ou talvez eu a tenha desestimulado a continuar... Mas se ela realmente estiver interessada em Crow, como penso que está, não vai desistir tão facilmente. Vamos testar.
Brett interrompeu o silêncio constrangedor, e fez menção de se retirar.
- Desculpe-me se a ofendi. Não foi minha intenção. Se me dá licença, vou voltar ao convés.
- Não... Não me ofendeu... Como sabe que sou uma ladra?
- Esquece que ajudei a tirá-la da prisão? – Foi-se a terceira...
Ela lhe deu um sorriso compreensivo e brincou com a xícara de chá sobre a bandeja.
- Conhece o Capitão Crow há muito tempo?
Ah! Eu sabia... Meus conhecimentos jamais falham...
- Pensei que o seu interesse era sobre a minha pessoa... – brincou notando que a deixara mais uma vez sem graça. Por isso resolveu emendar sorrindo – Não se preocupe... Já estou acostumado... Conheço o Crow há mais de... Doze anos.
- Então... – ela arregalou os olhos e o encarou como se o visse pela primeira vez.
- Olhe, senhorita Ana, não sei o que está acontecendo entre vocês dois, mas vou lhe dizer apenas uma coisa, pois se mais eu falar é provável que perca meu melhor amigo. A maioria da tripulação do Enterprise não concordou com o que Drake fez a sua família, mas o único que teve culhões para dizer isso a ele foi o Crow. Infelizmente ele não conseguiu evitar a tragédia.
Nesse instante, Didier invadiu o aposento, reclamando do balanço do navio e maldizendo a demora em chegarem à terra firme. Restou apenas a troca de olhares complacentes entre Ana e Brett.
- Espero que aproveite bem o seu desjejum, milady. – Fez uma reverência e saiu.
- O que estava havendo aqui? – perguntou Didier desconfiado ao notar a estranha expressão no rosto de Ana. – Por acaso esse porco inglês estava dando em cima de você?
- Não seja idiota, Didier! Claro que não. Ele é um cavalheiro. Totalmente diferente de você.
- Se o Capitão Crow souber disso não vai gostar nada, nada... Afinal ...
- Cale-se, Didier! – exclamou sem paciência – Deixe de pensar bobagens!
- Está bem, está bem... – acalmou-a enquanto desviava o olhar para a bandeja com biscoitos, pão e até... uma maçã!
Notando a expressão interesseira dele para o seu café, acabou por desprezá-lo, pois acabara de perder o apetite.
- Pode comer. Estou sem fome.
- Tem certeza?
- Tenho. – E retirou-se para junto da única janela que havia no ínfimo espaço de sua atual residência, mergulhada em pensamentos.

A embarcação aproximava-se das ilhas descobertas no início daquele século por um espanhol de nome Bermúdez. A apreensão entre os piratas, mesmo os mais experientes do Highlander, era evidente. Além de ser uma região frequentemente açoitada por grandes tempestades ainda havia os boatos sobre monstros marinhos e os fantasmas dos lendários habitantes de Atlântida que vagavam por ali em busca de recrutas. Não tardou muito a esses temores solidificarem-se diante de seus olhos na forma de um furacão que se formou no início daquela tarde sombria. O medo e o calor desciam sobre eles como uma manta de vapor quente. As ondas subitamente aumentaram em tamanho e ferocidade. Os ventos embarrigavam exageradamente o velame.
- Reduzir velas! – gritou Crow.
Brett correu para ajudar os timoneiros a iniciarem as manobras de controle do navio contra a agitação crescente do mar.
- O que está acontecendo? – perguntou Didier atarantado com a correria dos homens a sua volta.
- É melhor ir para a cabine e ficar por lá. Não saiam até estarmos livres dessa tempestade. – ordenou Crow enquanto ajudava a estreitar a vela maior, numa tentativa de manter o rumo, aumentar a velocidade do Highlander e facilitar a fuga do olho do furacão.
- Aquilo é um furacão? – voltou a perguntar quando viu a coluna de vento e água elevar-se da superfície a poucos quilômetros de onde estavam. – Nous allons mourir! Oh, mon Dieu! – exclamou aterrorizado com a imagem e o prenúncio de um naufrágio a sua frente.
- Pode começar a rezar, mas faça o que eu disse! Agora! – ordenou Crow mais uma vez, preocupado com a situação.
Recuperado da momentânea paralisia provocada pelo medo, Didier obedeceu a ordem recebida e correu para os aposentos sob o convés. Entrou correndo e fechou bruscamente a porta atrás de si, como se isso pudesse evitar que a turbulência o alcançasse ali.
- O que está havendo, Didier? Que cara é essa? É só um mau tempo... Não é? – insinuou Ana ao ver o rosto assustado de seu pai adotivo.
- É melhor começarmos a orar, menina. Reze para que o seu Capitão Crow e a sua tripulação sejam bons no controle dessa gaiola de madeira, caso contrário não chegaremos vivos às Caraíbas.
- Não é apenas chuva?
- Já deu uma olhada na janela? – perguntou com o nariz grande e vermelho apontando para o fundo do quarto.
Ana ficou boquiaberta ao ver o cone de nuvens escuras em movimento que se formava no horizonte. O céu parecia um borrão cinza e as ondas elevavam-se de tal forma que já cobriam sua visão vez por outra. Seu pensamento dirigiu-se diretamente para Crow. E se nós morrermos? Se eu nunca mais vir Nigel? Preciso falar com ele!
- Vou lá fora ver o Nigel. – afirmou decidida.
- Nigel? Que Nigel? De quem você está falando?
- Estou falando do Capitão Crow – esclareceu.
- O que pensa que vai fazer, sua maluca?
Ana não se deu ao trabalho de responder. Respirou fundo e foi direto para a porta da cabine.
- Onde você pensa que vai? Ele ordenou que ficássemos aqui em baixo!
Ainda incerta sobre seus sentimentos, mas sentindo uma necessidade premente de ver o capitão do Highlander, precipitou-se para fora do alcance dos chamados de Didier. O vento aumentara consideravelmente. No timão podiam ser vistos três homens aplicando toda sua força para manobrá-lo, dentre eles, Brett. Crow gritava ordens e auxiliava aos marujos, que, por sua vez, corriam para atender suas funções da melhor maneira possível. Todos queriam escapar da fúria dos ventos e da água selvagem que ameaçava engolfá-los. Diante daquele quadro assustador, ficou entorpecida. Agarrada a amurada, onde fora jogada por uma rajada de ar mais forte, sentiu a chuva fina açoitar-lhe a pele do rosto. Não notou quando um dos mastros menores, não suportando a violência da ventania, vergou-se a ponto de rachar. Crow foi alertado do perigo no convés quando ouviu o clamor de Bald.
- O mastro da popa vai se partir em dois!
Só então Crow a viu. Ela estava no caminho entre o pesado mastro e a amurada completamente apavorada. Saltou habilmente de onde estava e correu, desviando-se dos homens e obstáculos, vencendo os golpes do vento e da chuva em seu caminho. A última coisa que viu foi o pânico inundando e escurecendo o castanho dos olhos de Ana. Chegou a tempo de tirá-la do caminho do mastro que se rompeu ao meio, no entanto, não o suficiente para livrar completamente a si mesmo. A dor aguda em seu ombro esquerdo, provocada pela estocada de um dos punhais de madeira originados da quebra do mastro e o consequente choque da cabeça contra o chão fez com que perdesse a consciência. Não ouviu o grito de desespero de Ana ao vê-lo caído inerte aos seus pés e com uma nódoa vermelha impaciente encharcando sua camisa branca.
- Nigel!
Brett ao ver o que tinha acontecido, colocou outro marujo em seu lugar e correu para o local do acidente. Imediatamente, alguns homens que estavam mais próximos tiraram o mastro do caminho, quando Brett os alcançou.
- Crow! – chamou enquanto o virava de frente e notava que ele estava inconsciente. – Ajudem aqui! Vamos levá-lo para a cabine!
Vendo Crow ferido, a única coisa que passava pela mente de Ana era o desejo de que ele continuasse vivo. Seguiu o grupo ansiosa. Colocaram-no sobre a cama de bruços. Brett terminou de rasgar a camisa que obstruía a visão do ombro de Crow e viu a carne rasgada próxima à omoplata. Não parecia ser um corte muito profundo, mas certamente não fecharia com um simples curativo.
- Vocês têm um médico ou alguém a bordo que saiba tratá-lo ? – perguntou Ana sem conseguir despregar o olho do ferimento.
- O mais competente está desacordado no momento... – respondeu Brett pesarosamente apontando a mão para Crow.
- Ai, meu Deus...
- Ana, por favor, – pareceu lembrar o perigo que os espreitava lá fora – tenho que voltar para o convés e levar o Highlander para longe do ciclone. Cuide de Crow. Vou mandar alguém que saberá o que fazer. Volto assim que estivermos a salvo. Antes que ela pudesse dizer alguma coisa, Brett saiu correndo.
Poucos minutos depois entrou um homem de olhos esbugalhados, barba por fazer, trajando um avental que um dia devia ter sido branco. Seu barrete da mesma cor fora arrancado pelo vento no caminho para a cabine.
- O Sr. Brett me mandou para ajudar o Capitão. – notificou-a observando o ferimento de Crow com expressão preocupada.
- Quem é você?
- Esse é o Liam, o cozinheiro! – apontou Didier.
- E cirurgião nas horas vagas, seu inútil! Vá buscar água! Precisaremos de panos e... Uma garrafa de rum. Temos que limpar isso aqui!
Ana pensou em repreendê-lo. Como podia pensar em bebida numa hora dessas? Entretanto, não quis brigar com a única pessoa que parecia ter alguma experiência com aquele tipo de coisa. Correu a verificar se ainda tinha água na jarra sobre a arca aos pés da cama. Visto que sim, tratou de abrir o baú, pegar um dos lençóis ali guardados e rasgá-lo, transformando-o rapidamente em ataduras. Enquanto isso, o cirurgião foi até o armário onde Crow mantinha as ervas medicinais, como o gengibre que usara para medicá-la, e ali passou a examinar algumas ferramentas cirúrgicas, incluindo um serrote, que ela preferiu não pensar em qual seria a finalidade de seu uso. Dentre os artefatos, ele tirou apenas uma agulha e alguns fios de algodão, o que a deixou menos aflita. Como Didier ainda estivesse parado, fuzilando o cozinheiro com o olhar, ela reiterou o pedido de Liam.
- Didier, traga o que ele pediu. Precisaremos de mais água.
- E rum! O que tenho aqui comigo não é suficiente – alertou Liam retirando uma pequena garrafa de bebida do bolso de seu avental.
- Eu vou! Mas só porque ela me pediu, seu porco.
- Rápido, Didier... Por favor!
- Moça, comece a limpar esse sangue enquanto ponho essa linha na agulha. Ele vai precisar ser costurado. Quanto mais tempo isso ficar aberto, pior.
- Oh, meu Deus... – Controlando da melhor maneira possível seu pânico, Ana começou a limpar o sangue em torno da lesão. – Tem certeza que sabe o está fazendo? Ele vai ficar bem? – perguntou em tom de súplica.
- Não tenho certeza de nada nessa vida, moça... Segurem-no! – Deu a ordem aos dois ajudantes que haviam auxiliado Brett a levar Crow para a cabine e que ainda estavam ali aparvalhados com os acontecimentos.
- Por quê?! – perguntou aflita, temendo o que aquele homem, acostumado a mexer em panelas, faria a seguir. Custava a crer que Brett o tivesse mandado para tratar de seu melhor amigo.
Quando os homens o seguraram, Liam abriu a rolha da garrafa em sua mão com a boca e jogou todo o conteúdo sobre a laceração, provocando um urro de dor em Crow.
- O que está fazendo?!
- O mesmo que ele faria, dona. Já o vi fazer isso muitas vezes sobre ferimentos piores que esse. O capitão diz que é para evitar infecção. Acho que também seria bom ele tomar um pouco, pois isso vai doer um bocado quando eu enfiar a agulha na pele.
Ana sentiu a cabeça rodar e por alguns instantes pensou que fosse desmaiar.
Onde está Didier que não volta com a água e o rum?
Crow começou a recuperar a consciência depois do choque provocado pelo contato do álcool no ferimento. Isso deu novo alento a Ana.
- O que está havendo? – perguntou confuso. Mais uma vez teve de ser segurado, pois quis virar-se na cama. – Soltem-me!
- Sinto muito, Capitão, mas tem uma cratera aí no seu ombro e vou ser obrigado a fechá-la.
- E Ana? Como ela está? – lembrou aflito quando não a viu.
- Estou aqui. – respondeu surgindo no campo de visão dele e deixando-o aparentemente mais tranquilo.
- Você está bem?
- Graças a você...
- E o ciclone? Preciso voltar para o comando!
- Capitão, tenho que costurar esse buraco antes.
- Você está muito ferido... Por favor, fique quieto... Brett está cuidando do Highlander. – suplicou Ana segurando-se para não cair com os sacolejos que se tornavam cada vez maism intensos.
- Preciso de algo para morder ou quebrarei todos meus dentes até o fim dessa sessão de tortura.
- Pedi para trazer rum, mas o imprestável do Didier ainda não voltou.
- Não quero beber nada. Preciso estar lúcido para voltar e ajudar Brett. Vamos logo com isso, Liam, por favor! – Voltou a deitar-se de bruços para que cozinheiro com jeito de açougueiro continuasse o seu trabalho.
Ana sorriu timidamente, aliviada por ver Crow acordado e disposto. Talvez o tal Liam não fosse tão mau assim, afinal o capitão parecia confiar no seu tratamento. O sujeito pegou algumas das ataduras que Ana preparara e enrolou-as de forma a produzir uma espécie de bastão. Esse foi dado a Crow para que ele mordesse durante o procedimento. O pior era o movimento provocado pelos ventos fortes que prejudicava o equilíbrio e atrapalhava o trabalho minucioso de Liam. Era impressionante ver a habilidade do homem, que, apesar das mãos enormes e grosseiras, possuía uma delicadeza admirável ao dar cada ponto, diminuindo pouco a pouco a abertura da ferida. Também a impressionou a coragem de Crow que não soltou nenhum outro tipo de gemido. Sabia que ele devia estar experimentando uma dor lancinante pela força com que mordia o improvisado mordedor e pelo suor que abundava sua testa e seu dorso.
Didier finalmente voltou à cabine, visivelmente bêbado, mas trazendo água e rum, conforme o solicitado. Havia se passado quase uma hora desde que ele deixara a cabine.
- Pensei que tinha se afogado no barril de rum! – praguejou Liam.
- Trouxe o que ela me pediu, seu descascador de batatas! – exclamou irritadiço e cambaleante, além do que seria esperado.
Depois de certificar-se que não ficara qualquer resíduo de madeira no corpo de Crow e lavar mais uma vez o corte já fechado com água e rum, Liam pediu que Ana fizesse o curativo com as ataduras que sobraram.
- Vou deixá-lo aos seus cuidados, moça. Duvido que consiga segurá-lo nessa cama, mas seria bom que ele descansasse.
- Eu ouvi isso, Liam. O descanso pode ficar para depois.
Com alívio, todos acabaram por notar que o balanço do Highlander diminuíra e a luz que entrava pela janela era provocada pelos últimos raios de sol do dia. As nuvens carregadas de cinza dispersavam-se. O aterrorizante ciclone se desvanecera. Apesar disso, Crow tentou levantar-se da cama, sendo retoricamente proibido por Ana.
- Pelo jeito Brett saiu-se muito bem no controle do navio. Assim, fique quieto para que os ferimentos cicatrizem.
Não reclamou nem tentou ironizar a repreensão de Ana. Estava extasiado com sua demonstração de preocupação e cuidados para com ele. Em seu último encontro ficara com a certeza que Ana o odiaria mais do que nunca ao saber de sua ligação com Drake.
- O senhor é um homem de sorte, Capitão. – falou Liam, piscando o olho para demonstrar o duplo sentido de sua observação. – Acho que já posso voltar para minha cozinha. Hoje merecemos uma refeição um pouco melhor que a dos outros dias.
- Obrigada ... – agradeceu Ana ao cozinheiro pirata.
- Fico feliz que tenha se recuperado bem da sua febre, moça.
- Febre?... Ah, sim... Claro. Obrigada...
- Vou levar esse peste aqui para tomar um ar e curar a bebedeira. Tomara que não tenha esvaziado todos os barris da minha cozinha. – disse Liam referindo-se a Didier, já o pegando pelo braço e arrastando-o para fora.
Aos poucos, os homens que haviam ficado para ajudar acompanharam a dupla e voltaram ao trabalho. Certamente o Highlander sofrera mais avarias que a quebra do mastro que ferira Crow, portanto teriam muito que fazer considerando reparos em alto-mar.
- Você foi muito corajosa. Obrigado por sua ajuda. – agradeceu Crow a Ana assim que ficaram sozinhos.
- Não fiz nada. Apenas estou retribuindo o que fez por mim... lá em cima. – falou sem olhar para ele, usando a desculpa de estar arrumando o material utilizado.
Virou-se ao ouvir o movimento sobre a cama e deparou-se com Crow sentado na beira do leito, com a mão friccionando a cabeça no local onde provavelmente surgira um galo, devido à batida que sofrera na queda. Entretanto, seus olhos a observavam.
- Eu já disse que deve ficar deitado... Deixe-me ver sua cabeça...
- Não é nada... Precisamos conversar, Ana...
- Temos muito que conversar... Mas não agora. Você precisa descansar... Por favor, Nigel... – pediu e instintivamente elevou o braço, tocando-o de leve no ombro são. Diante desse gesto, Crow não pode evitar a ternura que tomou conta de seu coração. Pegou a pequena e acalentadora mão, levando-a aos lábios e beijando-lhe suavemente a palma.
- Crow! Conseguimos! – Brett entrou sem aviso comemorando o sucesso de sua empreitada. Estacou ao perceber que interrompera algo importante. – Desculpe... Não sabia que...
- Maldição, Brett... – disse Crow entre dentes – Parece que você está se especializando nesse tipo de interrupção.
Ana não pode deixar de sorrir, iluminando o espírito de Crow. Sentiu que mais de um ciclone havia sido contornado, embora fosse imprevisível o surgimento de outros.

(continua...)

Parece que eles vão se acertar, não? Porém, como ainda tem muita água para rolar nesse mar, muitos problemas ainda estão por vir.
Adorei os comentários fofos da Léia (que está tentando ler os capítulos anteriores e quase chegando aqui) e do Luiz Fernando. Claro que tb amei saber das emoções que minha história está provocando na Brih, na Nadja e na Lucy. Todos meus amigos muito queridos, a quem deixo aqui o meu afago e meu agradecimento. Um beijo carinhoso!

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

O Corsário Apaixonado - Capítulo VI

- Meu grande amigo, vejo que algo muito sério está acontecendo. – concluiu Brett em tom sarcástico.
- O que quer dizer com isso? – perguntou Crow de cenho fechado, ainda a lembrar do olhar cheio de rancor de Ana.
- Jamais pensei em vê-lo apanhar de uma mulher e não apresentar nenhuma reação. Acho que essa rapariga conseguiu penetrar onde muitas já tentaram e nenhuma conseguiu...
- Sobre o que está falando, Brett? – indagou aborrecido.
- Sobre isto aqui, meu caro – respondeu batendo de leve sobre o lado esquerdo do peito de Crow. – Terei de cumprimentar a moça se ela conseguir realizar essa proeza.
- Não diga bobagens, Brett! – afastou-se mal humorado do companheiro pegando a luneta para mirar o horizonte e disfarçar o efeito provocado pelas palavras do camarada.
- Tomara que sejam bobagens... – divagou Brett, tornando-se subitamente sério. – Crow...
- O que você quer agora? – perguntou irritado sem olhar para o imediato.
- Ela é quem eu estou pensando?
Crow, ainda de costas, largou a luneta.
- Quem? – tentou fazer-se de desentendido, mas percebeu que Brett não poderia ser enganado por muito mais tempo.
- É ela, não? A filha do Duque de Vilardompardo e da inglesa... Por isso você a soltou da prisão e a trouxe para cá. Custei a acreditar, mas tenho percebido os cuidados que tem com ela. Depois do que vi agora há pouco, tive certeza. – O silêncio de Crow confirmou suas suspeitas. – A mãe sobreviveu?
- Não. – respondeu após alguns segundos de ponderação silenciosa. Não era justo manter segredo da situação com Brett. Ele vivenciara a ação de Drake e sua vida também fora marcada de certa forma por tais fatos do passado.
- Que tal conversarmos sobre isso?
Crow virou-se e o encarou de frente.
- Eu ia lhe contar quando chegássemos a Eleuthera.
- Não precisa explicar as razões. Apenas quero que saiba que pode contar comigo para o que precisar. Sabe que tenho uma dívida com você...
- Não há dívida alguma, Brett.
- Nem culpas, suponho.
- Esse é outro assunto.
- Tudo bem... – Sabia que o tema culpa exigia mais que uma conversa superficial. Por isso não insistiu. – Agora, me conte essa história e me diga o que pretende fazer.
- É melhor manter essa conversa em sigilo. Vamos sair daqui. – Pensou em ir para sua cabine, mas ela estava ocupada pelo motivo da discussão. Por isso, rumaram para os porões. Talvez a sala de armamentos estivesse livre de intrusos.
Olharam para os lados enquanto se deslocavam para baixo, a procura de curiosos, sem saber que a revelação de Brett já tinha encontrado um bom e ganancioso ouvinte que passava sob a ponte minutos antes. Munido da valiosa informação, saíra sem que os dois amigos percebessem sua presença.

À noite, Crow manteve-se acordado por horas, andando no convés, adiando o retorno à cabine e o encontro com Ana. A conversa com Brett pelo menos o deixara mais seguro acerca de seus planos, mas não o fizera esquecer as sensações provocadas por Ana quando a beijou e que ainda faziam seu coração bater mais forte a simples lembrança.
Quando o sono se tornou um peso insuportável em suas pálpebras, resolveu ir para o pedaço de chão que sua cabine ainda lhe reservava. Certamente Ana estaria dormindo e não precisaria enfrentá-la. Na penumbra, onde apenas a chama fraca de uma lamparina ainda brilhava por trás do biombo que dividia o aposento, ele entrou e foi direto a procura de seu travesseiro e do lençol com que costumava dormir. Ao olhar para a cama, uma surpresa. Estava vazia. Lençóis intactos. Nem sinal de quem os utilizava nas últimas noites. De repente, entrou em pânico. Teria ela se jogado ao mar? Não seria louca a esse ponto. Estaria dormindo em um dos botes, arriscando-se a ser descoberta por algum marujo com na primeira noite? Mataria qualquer um que ousasse tocá-la, mesmo que isso significasse um motim. Olhou em todos os poucos cantos da peça e quando já pensava em sair e procurá-la no convés, viu um pequeno vulto a um canto, não percebido quando entrou, meio que sob a escrivaninha, enrodilhado em si mesmo, coberto por um cobertor. Tinha uma almofada sob a cabeça e sussurrava palavras desconexas que pareciam fazer parte de um pesadelo. Aproximou-se dela e confirmou que dormia, apesar de agitada por prováveis maus sonhos. Quase sem se dar conta, sua mão rumou direto para os cabelos avermelhados que se esparramavam revoltos sobre o travesseiro improvisado e o assoalho. Retirou uma das mechas que lhe caíam sobre a face. Movido pelo alívio de vê-la em segurança e pela necessidade de dar-lhe conforto, envolveu-a como a um bebê e levou-a para a cama. Imaginava que ideia infantil tinha sido aquela de dormir no chão, escondida. Sorriu ao ter esse pensamento, enquanto a carregava. Seu rosto podia sentir a respiração cálida e perfumada, agora mais tranquila. O pesadelo parecia ter chegado ao fim, pois ela suspirou aliviada na segurança de seus braços. Ao colocá-la sobre o leito, viu seu pescoço envolvido pelas mãos quentes e macias, insistentes em não deixá-lo afastar-se. De olhos fechados, Ana sussurrou seu nome de batismo.
- Nigel...
Ela ainda dormia, mas agora seu rosto expressava uma estranha paz e uma candura que fizeram de Crow prisioneiro. Relutante entre o desejo de beijá-la novamente e a improbidade deste ato enquanto ela se encontrava indefesa pelo sono, acabou por ceder ao primeiro, tocando de leve os lábios em sua face e arrancando-lhe um discreto gemido. Incentivado pelo doce gorjear de aprovação, continuou a roçar-lhe de leve a pele com a boca até chegar à região carnuda e rubra que tanto o atraía. Ali depositou o seu "durma bem" seguido de um casto beijo. As mãos o liberaram e, com a mesma expressão de tranquilidade, Ana virou-se para o lado e continuou a dormir, deixando Crow em estado de agradável transe. Em segundos, a sua voz interior voltou a ameaçá-lo, caso não parasse de se enganar. Ela está inconsciente, seu idiota. Provavelmente está sonhando com outro e você fica aí todo bobo, imaginando coisas. Vá dormir! Obediente, foi isso que ele fez. Seguiu para onde Ana dormira e lá se deitou, caindo no sono a sorver deliciado o cheiro que ela deixara na almofada e na coberta.

Ao abrir os olhos na manhã seguinte, Ana espreguiçou-se e constatou que a noite fora estranhamente repousante. Sentou-se confusa na cama, olhou em volta e só então percebeu onde estava. A tênue linha entre o sono e o despertar se quebrara e ela estava de volta à realidade. Como fora parar ali? Quem a levara para a cama? Perguntava-se, apesar de intuir a resposta. Pelo menos ainda continuava vestida, sinal de que ele não tentara nenhuma intimidade maior. Lembrou o pesadelo que tivera. Terrível, com perseguições, o rosto do horripilante Capitão Drake perseguindo-a, querendo jogá-la aos tubarões. A angústia de não ver saída e a certeza da morte certa. Também lembrou que alguém apareceu para salvá-la. Um homem saído da sombra de Drake. Um homem de cabelos negros, verdes olhos cativantes... Nigel... Parecera tão real... O toque dos lábios em sua pele... As lembranças da manhã do dia anterior confundiam-se com as sensações em seu sonho e o desejo por Crow percorria seu corpo como frêmitos incandescentes.
Levantou-se e, na ponta dos pés, foi verificar se ele dormia do outro lado do biombo. Constatou aliviada que estava só. Viu apenas a almofada e a coberta em que se deitara na noite anterior sobre a cadeira junto à escrivaninha. Voltou ao quarto e viu a jarra com água limpa e uma muda de roupa sobre os pés da cama. Por que ele tinha que ser tão gentil? Culpa? Sua suspeita de que ele a conhecera no navio de Drake era cada vez mais forte. Quem era esse homem? Por que ele lhe despertava sentimentos tão ambíguos? Por que não conseguia parar de pensar nele e em seus beijos? E se ele realmente fosse parte daquela tripulação que vira sua mãe e ela serem jogadas ao mar e nada fizera para evitar? O que faria com tudo o que estava sentindo se isso fosse verdade? E se... Perguntasse a ele?

Os dias seguiram calmos para a navegação. Ana às vezes ia até o convés para respirar um pouco de ar fresco. Nessas horas, Brett a acompanhava de perto, a pedido de Crow. Aos poucos ela parecia estar se adaptando à vida no navio e perdendo um pouco de seus medos. Por sua vez, Crow sempre dava um jeito de manter-se ocupado, longe dela e seus passeios a bordo. Era à noite que ele, depois de fazer sua ronda noturna, que acabara por tornar-se um hábito, entrava na cabine, certificava-se que ela dormia e ficava a admirá-la em seu sono durante uns poucos minutos. Em alguns desses momentos, Ana apenas fingia estar dormindo. Sentindo a presença de Crow, no início, esperava que ele tivesse uma atitude condizente com sua condição de pirata. Poderia atacá-la, vingar-se da bofetada que recebera, humilhá-la ou, quem sabe, acabar com o serviço que Drake iniciara, jogando-a para fora do Highlander. Porém, nada disso ele fazia. Ao contrário de qualquer expectativa, ele apenas a olhava. Podia sentir sua respiração acelerada, o calor de sua pele a medida que ele se aproximava da cama, o perfume natural de sua transpiração que provocava seu desejo de esconder-se naquele peito amplo e forte. Lutava contra a vontade de abrir os olhos e chamá-lo para junto de si.
Numa dessas noites, foi derrotada pela luxúria e acabou por denunciar-se ao abrir os olhos para vê-lo. Pego em flagrante, tentou disfarçar.
- Pensei que estivesse dormindo... Precisa de algo? – dissimulou com voz rouca e tensa.
- Não... – Sim, pensou.
- Então... Boa noite. – ...Por que eu terei outra noite infernal..., pensou ele.
Com um peso em seu peito e um nome na ponta da língua, ao sentir que ele a deixaria, não suportou.
- Nigel...
A voz saíra como um doce sussurro que o fez estremecer.
- Sim? – Permaneceu parado, tentando evitar o olhar de Ana, numa demonstração de embaraço que a excitou ainda mais.
- Quero me desculpar pelo que fiz no outro dia.
- Pelo o quê?
- O tapa que dei no seu rosto.
Um sorriso tímido surgiu na penumbra do quarto.
- Acho que mereci por ter agido como um canalha.
- Você não agiu sozinho... – Sentia a pele de seu rosto arder em brasas e o corpo reagir à proximidade dele.
A necessidade imperiosa de tocá-lo a fez sentar-se na cama. Antes que se colocasse de pé, ele se ajoelhou ao seu lado e pegou sua mão.
- Eu não sou digno de você... – Ondas de verde intenso a envolveram e sua mão foi pousar sobre a face que antes ela agredira.
- Nigel... – Irresistivelmente atraída aproximou os lábios da barba macia que cobria a expressão embevecida dele.
Digno ou não, ele não pode conter a vontade de beijá-la ao sentir aquele toque e ao ouvir a voz que tornava seu nome em melodia. Mais uma vez, como magnetizados por um potente imã, entregaram-se numa ânsia voraz ao desejo de sentirem mais uma vez o gosto e o calor um do outro. Logo, os beijos já não eram mais suficientes para lograr a cobiça. As mãos de Crow buscavam sentir a maciez dos seios de Ana sob a camisa de algodão, enquanto ela gemia agarrando-se às espáduas musculosas e suadas, puxando-o contra si. Logo estavam deitados sobre a cama e os dedos de Ana buscavam os botões da camisa de Crow. Necessitava senti-lo de forma mais completa. Quase gritou de prazer quando ele beijou e mordiscou seus seios, um a um. Foi quando sentiu algo duro e pulsante sobre sua coxa. Então, surgiu o medo. Já ouvira coisas terríveis a respeito das relações entre homens e mulheres. Nunca tivera quem lhe explicasse como isso ocorria. Já ouvira falar na dor e nas sensações desagradáveis que um homem poderia provocar em uma mulher, da boca de prostitutas. Era difícil imaginar que aquilo que estava sentindo naquele instante pudesse levar a algo tão ruim. Entretanto este pensamento a resfriou e a fez pensar em uma pergunta.
- Nigel...
- Sim...? – respondeu enrouquecido quando passava a língua em torno do mamilo esquerdo.
- Diga que você não estava no navio de Drake naquele dia...
Como se a lâmina de uma guilhotina o partisse em dois, ele fechou os olhos por alguns instantes, sentindo o amargor de ter sido descoberto. Lentamente, voltou a cobrir os seios de Ana com a camisa e levantou-se, como se carregasse o mundo nos ombros.
- Infelizmente, Ana... Não posso mais mentir para você..., apesar de saber que vai me odiar por isso. Sinto muito... – conseguiu responder, intimamente recriminando-se pela insensatez de seus atos momentos antes. Aturdida pela confirmação de suas suspeitas e sem forças para reagir, permaneceu deitada, ainda com o rosto afogueado, encolhendo-se sobre si mesma, maldizendo sua pergunta e o destino que permitira que sua vida cruzasse mais uma vez com alguém de um passado que ela desejava de todas as maneiras esquecer. As lágrimas rolaram livres em seu rosto assim que Crow saiu em triste silêncio e a porta da cabine se fechou.

(continua...)


Essa dupla dá um trabalho que vocês não imaginam... Não sei quanto tempo ainda eles vão ficar nessa situação aflitiva. Para que vocês entendam um pouco dessa culpa do Crow, que às vezes parece meio absurda, temos que lembrar que ele já alimentava a culpa de outra morte no seu belo inconsciente. A de sua mãe. Lembram? Por isso o desespero para ajudar aquela outra mãe e sua filha e a culpa sentida por algo que estava totalmente fora do seu controle. A mente das pessoas pode ser bem complicada, não acham?
Bem, espero voltar com mais emoções em breve.
Beijos!!

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

O Corsário Apaixonado - Capítulo V


- Todos ao convés! Navio à vista!
Crow levantou-se rapidamente, vestiu a camisa e saiu correndo. Ana ao ver a movimentação, preocupada com o que poderia estar acontecendo, correu atrás dele.
De pé, na ponte, junto à amurada, segurando a luneta, Crow já tentava identificar seu perseguidor, que avançava a toda a velocidade. Seu olhar voltou-se preocupado para Brett, ao seu lado.
- Melhor sermos cordiais e ver o que ele quer.
- Quem é ELE? – perguntou Ana, surgida repentinamente ao lado deles.
- O que você está fazendo aqui? Volte já para a cabine – grunhiu Crow entre dentes surpreso ao vê-la por ali.
- Estou ficando farta de ficar na cabine. Além do mais, já mastiguei tanto gengibre que já não sinto mais enjôo – disse, apesar de ainda tremer por dentro ao ver a imensidão do mar através das amuradas do navio. Atrás da aparência arrogante, tentava esconder o medo, que ainda a assaltava, quando pensava que era novamente passageira numa viagem marítima.
- Talvez seja melhor fazer o que o Crow está mandando, senhorita – interferiu Brett. – Naquele galeão que se aproxima está um dos piratas mais ardilosos que existe navegando por esses mares.
- Ele é espanhol? – perguntou, depois de engolir em seco.
- Que eu saiba, ele não trabalha para ninguém – respondeu Crow, notando que ela ficara preocupada com a nacionalidade do bandido. Ele ainda não conseguira arrancar dela os motivos para ter tanto medo da Espanha e de seus conterrâneos. – De qualquer maneira, é melhor se manter escondida lá embaixo até sabermos o que ele quer.
A distância já diminuíra entre as duas embarcações e o nome do galeão já era passível de se ler: El Tiburón. Ana resolveu seguir o conselho de Crow e voltou correndo para o reduto inferior.
Didier que estava por perto, quando viu Ana descer correndo, resolveu informar-se melhor sobre o que estava ocorrendo.
- É apenas um velho colega de pirataria. – informou-lhe Brett – Certamente quer apenas vangloriar-se de seus feitos e partir.
- Pete! Diga para os homens ficarem a postos na artilharia! – gritou Crow para seu contramestre.
- Certo, Capitão!
- É assim que recebem colegas de profissão? Acho que vou fazer companhia para Marie. – Ele ainda a chamava com o nome com o qual a rebatizara e tampouco sabia sobre seu parentesco com a nobreza espanhola. Pelo menos com certeza.
- Talvez ele esteja indo para a Ilha de São Miguel. Não estamos muito longe dela. Ele costuma saquear aqueles pobres ilhéus – Crow cogitou com Brett tão logo Didier desapareceu sob o convés.
- Talvez... Ele não tem motivo algum para nos atacar. – concordou o imediato. – Mas não custa nos precavermos contra ele.
Olhou mais uma vez pela luneta e viu um dos marujos do El Tiburón fazer sinal para emparelharem.
- Não estou gostando disso...
- Crow... Isso não tem nada a ver com essa dupla que estamos levando, não?
- Espero que não... – respondeu com ar preocupado.
- Estão pedindo para vir a bordo, Crow! – exclamou Bald sob a ponte.
- Arriar velas! Diminuir velocidade! A postos! – significando dizer para ficarem atentos e de armas em punho – Venha comigo, Brett. Vamos ver o que Castilhos quer conosco. – solicitou Crow.
Ambos seguiram até estibordo, onde os navios se aproximaram o suficiente para que a tripulação pudesse conversar entre si.
- Buenos dias, caro amigo Crow! – saudou Castilhos, o comandante do El Tiburón. Sua aparência indicava uma ascendência árabe. Usava um lenço preto cobrindo parte dos cabelos negros e escorridos e um rosto bronzeado, de traços bonitos e másculos, mas que não inspirava confiança. Seu sorriso era maligno e combinava perfeitamente com sua fala sibilante e aleivosa. O charme em seu modo de falar e em seus movimentos pretendia disfarçar a ferocidade intrínseca.
- Bom dia! Que ventos o trazem até nós?
- Bons ventos, amigo! ¿Puedo hablar con usted?
- É claro... amigo... – respondeu Crow irônico. Nunca simpatizara com o pirata espanhol. Apenas mantinha uma relação cordial para evitar confrontações desnecessárias. – Traga a prancha para embarque, Bald!
- Pois não, Crow... – O velho marujo também não gostava muito de Castilhos. Por ele, colocaria o pirata na prancha e o jogaria aos tiburones.
- Apenas você, Castilhos. – solicitou Crow, quando mais dois comparsas do castelhano fizeram menção de embarcar no Highlander.
- Claro, amigo... – sibilou o pirata – Quédate aquí y espera! – ordenou aos seus homens, ríspido e visivelmente aborrecido.
- Sua armas, por favor – exigiu Bald quando Castilhos terminou de atravessar a prancha que ligava os dois navios.
- Crow... Vim em paz, amigo... – falou com um sorriso matreiro.
- Então mais um motivo para entrar desarmado no Highlander. Tenho certeza que faria o mesmo por mim,... amigo. – revidou com sorriso idêntico.
- Está tudo bem... – acabou por dizer para acalmar o ânimo de seus marujos, que já se aprontavam para defender seu capitão. – Podemos ir ao seu gabinete?
- O dia está tão bonito que prefiro ter essa conversa aqui mesmo.
- Está com algum convidado importante que eu não posso ver?
- De onde tirou essa ideia? – Crow cheirou alguma artimanha no ar. – Não vejo motivos para não termos uma conversa entre amigos aqui mesmo.
- Alguma señora que sequestrou seu coração, Crow? Está com medo que ela se encante por mim? – continuou em tom sarcástico.
- Castilhos, vamos ao que interessa e sem rodeios. O que o traz ao meu navio?
- Podemos pelo menos ir até sua ponte de comando? O assunto é delicado.
- Vamos. – concordou de mau humor. Não estava gostando daquela conversa melosa.
Na coberta superior, Crow pediu que Brett fosse verificar os amantilhos, mais como uma desculpa para não partilhar com ele a conversa que Castilhos pretendia ter. Brett entendeu o recado e retirou-se de má vontade. Castilhos também fazia parte da sua lista de personas non gratas.
- Muito bem. Agora estamos a sós. Qual é o assunto delicado? – Crow começava a ficar impaciente.
- Soube que você facilitou a fuga de uma ladra da prisão de La Rochelle. É verdade?
- As notícias andam se espalhando mais rápido do que eu imaginava. Como soube disso?
- Bem... Eu estava ancorado ali por perto e soube do ocorrido.
- E o que mais quer saber?
- Ela está com você?
- Não. Por quê?
- Posso saber o que fez com ela?
- Eu a deixei em Saint-Jean-de-Luz com o pai... Por que esse interesse por uma simples ladra?
- Digamos que o chefe Menotté ficou furioso com a fuga debaixo dos bigodes dele e estaria oferecendo uma gorda recompensa para quem a levasse de volta e, se possível, junto com quem a tirou da prisão... Mas se você diz que a deixou em território francês, eu acredito. Não ocuparei mais o seu tempo... Só me diga uma coisa. Por que o seu interesse nela? Só por curiosidade, é claro...
- Só por curiosidade, Castilhos... Você teria coragem de entregar um colega de pilhagem?
- Claro que não, amigo! Pensei apenas em lhe poupar o trabalho de entregá-la, para depois dividir a recompensa com você, meu caro.
Crow soltou uma gargalhada, imaginando até onde chegaria a canalhice daquele homem.
- Óbvio! Como não pensei nisso antes... – disse sarcasticamente, encarando o outro. – Apenas para responder a sua "curiosidade"... Eu fui vítima desta ladra, que por sinal era uma bela garota. Quando soube que ela tinha sido presa e que perderia sua linda cabecinha, resolvi ajudá-la. Assim que cobrei meus "honorários" de herói, – deu uma piscadela maldosa – deixei-a em Saint-Jean-de-Luz com seu pai, que ajudou na fuga. Satisfeito?
Castilhos pareceu decepcionado, mas Crow não acreditava que ele pudesse ter sido convencido tão facilmente.
- Saint-Jean-de-Luz...
- Se correr, talvez ainda os pegue por lá. Duvido que queiram voltar por vontade própria para Rochelle.
- ...
- Aquele velhaco! Onde está aquele cão sarnento?! – gritou um dos marujos, vindo do alojamento.
Brett imediatamente tentou controlar o sujeito.
- O que houve?
- Aquele ladrãozinho de merda. Roubou meu relógio! Eu vou matá-lo!
- Acalme-se! Vamos conversar lá embaixo.
Brett conseguiu convencer o homem a descer, mas infelizmente o fato já havia chamado a atenção de Castilhos.
- Parece que ainda há ladrões por aqui...
- Eu diria que, contando entre nossos dois navios, devemos ter mais de sessenta...
Agora era a vez de o espanhol gargalhar, homenageando o senso de humor de seu colega inglês.
- Bueno, mi amigo, creio que chegou a hora de partir. Não quero atrasá-lo mais. – disse por fim, para alívio de Crow, que já começava a ficar impaciente com a demora da visita. – Creio que vão para Eleuthera, não?
- É sempre um prazer receber amigos à bordo, señor... – reverenciou com um meneio de cabeça, sem responder à pergunta. – Adiós!
Assim que Castilhos deixou o Highlander, Crow ordenou o retorno imediato ao curso anterior e que as velas fossem esticadas ao máximo, aproveitando o vento que soprava do leste. Dadas outras ordens para o retorno à viagem interrompida pelo espanhol, foi à procura de Brett.
Este se encontrava no alojamento ainda tentando acalmar o marujo que havia sido ludibriado por Didier.
- O que está acontecendo aqui? – perguntou Crow incisivo.
- Capitão, eu quero que aquele miserável do seu passageiro, aquele bandido, filho de uma rameira, devolva o relógio que ele me roubou. – O homem já tinha se acalmado um pouco, mas a raiva contida era visível.
- Como sabe que foi ele?
- Eu o peguei remexendo em minhas coisas ontem à noite. A desculpa foi de que estava procurando um pouco de bebida para "poder dormir melhor nessa espelunca", conforme ele mesmo disse. Hoje, quando fui ver minhas coisas, o relógio havia sumido.
- Eu vou falar com ele. Agora se acalme e volte ao seu trabalho. Queremos chegar logo a Eleuthera.
- Está bem, capitão.
- Crow... Depois que resolver o assunto Didier, precisamos conversar.
- É algo urgente?
- Não... Nada urgente...
- Então falamos depois... Agora trate de fazer essa caravela deslizar o mais rápido que puder para casa. – disse em tom de gracejo, tentando disfarçar a preocupação com a visita de minutos antes.

Assim que entrou na cabine, encontrou o olhar apreensivo de Ana.
- O que ele queria?
- Apenas uma visita cordial... Onde está Didier?
- Ici, monsieur! Estava admirando as instalações onde minha filha tem estado nos últimos dias. Espero que a esteja respeitando... – sugeriu petulante.
- Lá vem ele... – suspirou Ana impaciente, escondendo seu rubor diante da insinuação.
- Quem não está respeitando as regras por aqui é você, seu ladrão de galinhas – E avançou raivoso contra o francês.
- Ei, ei... O que foi que eu fiz?
- Você andou aprontando aqui dentro? – Ana voltou-se para o ladrão. – O que houve? – perguntou a Crow.
- Sumiu um relógio de um dos meus homens e ele diz que foi Didier.
- Absolument, monsieur! Eu não peguei nada! – E falava com a cara mais inocente do mundo.
- Se não devolver, serei obrigado a entregá-lo para o meu marujo e deixar o interrogatório a critério dele.
- Devolva, Didier. Devolva agora esse relógio. – ordenou Ana antes que o homem pudesse atuar como um pobre acusado injustamente.
Ele lançou um olhar irritado para Ana e outro para Crow. Não teve outra opção a não ser vasculhar um dos bolsos da calça e retirar de lá uma das mais recentes invenções do homem, feita em prata, e que certamente era produto de uma das últimas pilhagens feita pelos piratas de Crow em mar aberto.
- Está aqui! – falou arreliado, mas sem a mínima vergonha por ter sido descoberto.
Crow agarrou o objeto e encarou-o com raiva.
- Se algo semelhante voltar a acontecer, prometo que irá para a prancha.
- Não precisa falar assim com ele – defendeu Ana, para surpresa de Crow. – Ele já devolveu, não? Além do mais, essa peça é roubada mesmo e, como você deve saber... "ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão"... " – relembrou uma expressão que Drake costumava citar e que havia ficado famosa entre os ladrões do mundo.
- Aqui, no meu navio, ele vai para a prancha se voltar a roubar! Entendido? – vociferou, pensando no por quê dela ter lembrado uma expressão de Drake. Seria alguma insinuação de que ela o havia reconhecido?
- Não sei por que tanto escândalo... Aposto que entre vocês isso seja muito comum... – disse Ana, mais como meio de instigar Crow, do que de defender a atitude de Didier, que ela também considerara errada. E continuou seu discurso de defesa. – Um bando de piratas, que vivem roubando de todo mundo...
- Obrigada, Marie – agradeceu Didier tão surpreso quanto Crow.
Por que Ana insistia em tirá-lo do sério? O pior é que só conseguia pensar em uma maneira de calar sua boca... Beijando-a.
- Para o conhecimento dos dois entendidos, eu comando um navio com cerca de trinta homens. A maioria deles tem um passado nada elogiável, muitos são assassinos, com pouca ou nenhuma moral. Eu não estaria vivo para esta conversa se eles não me respeitassem. Esse respeito, conseguido ao longo de anos, não foi adquirido roubando ou enganando meus homens. Dentro dessa embarcação existem leis e regras a seguir e é assim que vai continuar sendo. Agora, monsieur Didier, o senhor vai até o alojamento devolver o relógio que roubou do meu marujo.
- Ele vai me matar! Entregue você!
- Tenho certeza que vai saber contornar essa situação com a sua lábia habitual.
- Mas...
- Agora! – gritou com o larápio, já no limite de sua paciência.
Tão logo Didier saiu escorregadio da cabine, Ana voltou a enfrentá-lo, colocando-se diante dele com as mãos na cintura.
- Você se acha muito superior a nós, não? Você não passa de um ladrão como qualquer outro, roubando para sobreviver. A única diferença é que tem um navio e pode roubar mais.
Crow não pode mais resistir, vendo-a assim tão próxima, a desafiá-lo, tão deliciosamente atrevida... Agarrou-a pela cintura e puxou-a contra seu corpo. Pasma com o abraço súbito e quase sem respiração, não ofereceu resistência.
- Se eu fosse um ladrão sem escrúpulos você já estaria na minha cama sob meu corpo, senhorita. – sussurrou pouco antes de selar os lábios de Ana com um beijo avassalador.
No início, ele sentiu as mãos dela sobre seu peito, empurrando-o debilmente. Logo as mesmas mãos avançaram trêmulas até seu pescoço, sua nuca, e embrenharam-se em sua cabeleira. Enquanto isso, os lábios túrgidos se conheciam e se descobriam sedentos. Quando Ana cedeu à intromissão da língua de Crow em sua boca, uma explosão de sabor e desejo os invadiu. A intimidade úmida e a agradável sensação de encontrar abrigo e deleite no outro tornou o beijo mais prazeroso. A necessidade de estarem juntos, colados um ao outro, se tornara imperiosa. Os dedos de Ana, depois de se perderem nos cabelos de Crow, provando o que tantas vezes ela imaginara, desceram por suas costas, cravando-lhe as unhas sobre o tecido fino da camisa, provocando nele um crescente desejo até então desconhecido e que agora o consumia como fogo. Insatisfeita, sua boca queria percorrer a pele de Ana e degustá-la por inteiro. Sôfrego, seus lábios desceram através do pescoço esguio, de pele suave, que se arqueou a sua passagem, quando ela jogou languidamente a cabeça para trás, aceitando de bom grado o carinho das lambidas e os beijos molhados. O toque de Crow avançou da cintura para o quadril, para as nádegas, pressionando e acarinhando, deliciando-se nas curvas e saliências suavemente arredondadas do corpo que a ele se entregava. Ana gemia ofegante e encantada, esquecida de quaisquer barreiras ou suspeitas capazes de se interpor entre ela e aquele homem. Jamais sonhara vivenciar tais sensações inebriantes e ansiava por mais. Muito mais. Queria tocá-lo de todas as formas possíveis e sentir a pele cálida e viril sob seus dedos.
Uma batida na porta foi o que bastou para que Crow fosse alertado a lembrar sobre quem era a mulher que o estava enlouquecendo de desejo. Sucumbindo a uma réstia de razão, afastou-a suavemente a tempo de vê-la com os olhos fechados e uma doce expressão de êxtase. Com um suspiro pesaroso, deixou-a. Com uma sensação de perda e abandono, Ana olhou Crow afastar-se em direção à porta, confusa sobre o que acontecera.
- Brett!... O que quer?... Algum problema?... – perguntou reticente, mas agradecido pelo ressurgimento da razão.
O imediato logo desconfiou que chegara em hora errada ao ver os cabelos desgrenhados de Crow e a face afogueada de Ana.
- Posso voltar em outra hora...
- Não! Você não interrompeu nada. Eu já estava mesmo saindo para procurá-lo.
Ao ouvir essas palavras, Ana sentiu o estômago contorcer-se e o peito constrito. Nada... A palavra retumbava em sua mente. Ele a beijara apenas para mostrar-lhe quem estava no comando. Afinal, ele era um pirata, sem sentimentos e nenhuma sensibilidade. Sentia-se envergonhada e humilhada por ter cedido aos supostos carinhos de Crow.
Quando ele se voltou para desculpar-se, pois teria que sair, sentiu em cheio a força da mão espalmada de Ana batendo em sua face. Também viu ira e revolta onde antes havia visto entrega e prazer. O ardor no local da bofetada era infinitamente menos doloroso que ver os olhos cor de mel fitarem-no com ódio. Ela tinha razão. Esse era o único sentimento que poderia nutrir por ele. Quanto mais cedo ele percebesse isso, melhor. Sem dizer palavra alguma, diante de um Brett abismado, deu as costas e saiu.
- Senhorita... – Brett despediu-se da passageira com um aceno de cabeça, deixando-a mergulhada em reflexões e dor.

(continua...)

Oi!! Parece que a coisa está esquentando e os "contatos imediatos de terceiro grau" começaram entre o nosso corsário e Ana. Infelizmente, os mal entendidos também.
Como já disse antes, estou amando escrever O Corsário... É uma pena que, apesar de estar em férias, ainda não tenho o tempo de que gostaria para me dedicar a escrevê-lo. Pelo menos consegui postar antes de fechar a semana. Também fiquei muito feliz com os comentários da Nadja, Aline e de minhas duas novas leitoras, Anitta e Briana (A Leitora). Vocês são uns amores.
Espero voltar logo com a continuação!
Beijos!