sábado, 9 de julho de 2011

O Corsário Apaixonado (continuação)

Nigel pôs em prática seu plano. Precisava descobrir uma maneira de embarcar num navio comercial para o Caribe, local onde poderia ficar livre da prisão por deserção. Sendo assim, foi em busca de notícias sobre as próximas partidas daquele porto. Entrou em uma das tavernas locais. Lá encontrou os mais variados tipos de frequentadores, desde oficiais da Marinha até ladrões e falsários do pior nível. Em uma das mesas, reconheceu um homem de cabelos brancos e ralos, cofiando um bigode espesso, que se unia à barba curta e afunilada no queixo. Era um dos importadores de algodão das Caraíbas, amigo de sua família, que estava a beber sozinho. Aproximou-se dele.

Senhor Krane
- Boa noite, Capitão Krane. – saudou cordialmente.
- Ora, se não é o nosso mais jovem oficial da Marinha, senhor Nigel Lodwick – regozijou-se ao ver o filho de seu grande amigo – Pensei que estivesse navegando a caça dos terríveis espanhóis junto com El Draco.
- E estava, Chegamos hoje à tarde, senhor.
- Sente-se, meu rapaz!
- Obrigado, senhor.
- Pretende visitar seu pai nesses dias de folga?
- Não vim para falar de meu pai e sim para pedir um favor.
- Sei que não tenho nada a ver com os problemas entre vocês, mas na última vez em que o vi fiquei muito preocupado. Só vi seu rosto esboçar um sorriso quando ele soube que estava bem e servindo a Marinha de Sua Majestade. – Como Nigel demonstrou certo mal-estar ao tocar no assunto, Krane resolveu não comentar mais nada sobre Timothy. – Está bem... Prometo que não falarei mais nessa questão de família. Só queria que soubesse que seu pai está preocupado e saudoso com sua ausência... Por favor, rapaz, diga. Qual o favor que precisa de mim?
- Suponha que não concordo com algumas atitudes de meu comandante.
- Imagino que ele não seja um homem muito fácil de lidar.
- Por isso gostaria de lhe pedir para acompanhá-lo em sua próxima ida às Caraíbas.
- Como? – Exclamou surpreso com o pedido do suboficial. – Tem ideia do que está me pedindo? Ou seria uma missão oficial? – cochichou.
- É deserção mesmo – confirmou Nigel em voz baixa.
- O que está me pedindo é muito grave... Como eu poderia fazer isso. Estaria agindo ilegalmente e contra minha rainha...
- Eu sei, meu senhor. Sinto muito por tê-lo incomodado. – disse fazendo menção de se levantar.
- Calma, meu jovem, calma... – objetou segurando-o pelo braço e forçando-o a manter-se sentado. – Vamos conversar...
O Senhor Krane não simpatizava muito com Drake e quando soube do ocorrido na última viagem de Nigel, concordou plenamente com a atitude do rapaz, apesar de achar que a deserção não era o caminho ideal a trilhar. Como não conseguiu convencê-lo de voltar atrás, acabou por ceder ao pedido de guarida, em seu navio, ao jovem Lodwick.
No dia seguinte eles partiram rumo à ilha de Eleuthera, território inglês nas Bahamas, numa viagem que durou apenas vinte dias, graças aos bons ventos. Lá, Nigel despediu-se do Capitão Krane sem saber que aquela era a última vez que o veria com vida, pois em menos de um mês sofreria um ataque de piratas espanhóis. Ele seria morto e seu navio afundado.
Alugou um quarto em uma das poucas pousadas da ilha, localizada ao lado de uma taberna. À noite era impossível dormir devido ao burburinho e às frequentes brigas entre arruaceiros e piratas, que vinham de toda a parte do mundo para buscar rum e prazeres com as nativas da ilha. Certa noite, cansado de procurar conforto impossível em sua cama, dirigiu-se ao bar para buscar sono profundo e alheio ao barulho dentro de uma caneca de rum. Lá chegando, observou um homem velho, mas elegantemente vestido, usando um lenço na cabeça à moda dos piratas. Seu semblante aristocrático não combinava com sua provável atividade profissional. Percebendo que estava sendo observado, levantou sua caneca em direção ao curioso Nigel, sinalizando cortesmente para que ele se aproximasse. Receoso sobre o teor de tal gentileza, Nigel levantou-se e seguiu na direção do elegante pirata. Antes de alcançá-lo, um sujeito cambaleante passou a sua frente, postou-se diante do corsário e começou a gritar impropérios. Como o outro continuasse serenamente sentado, olhando-o altivamente, apesar de sua posição inferior em relação ao agressor, esse se lançou sobre a mesa e pegou o outro com as duas mãos em seu pescoço. Ao ver a cena, Nigel foi ao encontro deles, tentando apartá-los. Tamborilou os dedos sobre o ombro do marginal e quando esse virou para ver quem era, levou um soco direto em seu queixo, o que o fez cair sobre a mesa com tremendo estrondo e quebra do copo e do prato que ali estavam. Ainda tonto, pelo trauma e pelo excesso de álcool, recuperou-se lentamente. Levantou-se do chão onde caira estatelado e partiu para cima de Nigel, que não precisou de muito esforço para defender-se do ataque e empurrar o desordeiro contra o balcão do bar. Enquanto ele se recuperava da tontura, que só parecia aumentar, o cavalheiro originalmente atacado levantou-se da mesa e foi buscá-lo. Pegou-o pelo colarinho desalinhado de sua túnica suja e, com um mínimo esforço, levou-o até a saída do bar, jogando-o na rua com a ordem de não lhe perturbar mais. Batendo as mãos, como se retirasse poeira delas, voltou-se para Nigel calmamente e convidou-o para sentar em outra mesa desocupada, já que a sua havia sido quebrada durante a briga.
- Deixe me apresentar, senhor... Sou o Capitão Brian Hawke e estou em dívida com você. Obrigado por ajudar-me com aquele rato de porão. Como devo chamá-lo, meu rapaz?

Capitão Brian Hawke
- Nigel Thomas Lodwick, senhor. – respondeu Nigel, reconhecendo o nome de Hawke como sendo o de um conhecido pirata escocês. Segundo ouvira, após pilhar os navios, com o mínimo de luta possível, deixava-os partir em paz. Devia estar milionário, pois geralmente atacava naus que carregavam ouro das colônias americanas ou transportavam passageiros da realeza.
- Você é novo por aqui, não?
- Cheguei há um dia e estou à procura de trabalho.
- Você não parece um marinheiro comum... Bem vestido, elegante, boas falas... Qual a sua história, Nigel? – perguntou interessado.
- Eu navegava com a Marinha inglesa, sob o comando de Sir Francis Drake. Tivemos um sério desentendimento por eu não concordar com alguns de seus métodos quanto ao tratamento dado aos prisioneiros de guerra. Assim, sem mais condições de permanecer sob seu comando, decidi abandonar meu posto no Enterprise.
- Um desertor?
- Espero que o senhor seja discreto e não espalhe essa notícia por aí, já que estamos em território inglês. – disse em voz baixa e tom cínico.
- Não se preocupe. Conheço muito bem El Draco... Ele nunca foi uma pessoa das mais agradáveis. Tivemos alguns problemas antes dele cair nas boas graças da Elizabeth.
Sem deixar de observar atentamente o jovem inglês insubordinado, fez um sinal para o taverneiro pedindo duas canecas de rum.
- Bebe comigo? – A um sinal afirmativo de Nigel com a cabeça, continuou – Ótimo... Acho que temos muito a conversar.
Quando o próprio taverneiro veio à mesa para servi-los, recebeu uma generosa quantia de moedas de prata que serviriam para reparar os estragos feitos pela luta de momentos antes.
Hawke era um homem extremamente agradável e que, apesar da vida ilícita que levava, parecia ser gentil e humanitário. Vinha de uma família de posses na Escócia e estudara para ser médico. Infelizmente suas habilidades para curar despertaram inveja em seus colegas, que acabaram por culpá-lo injustamente pela morte de um conde. Para fugir da prisão jogou-se no primeiro navio que içou a âncora no porto de Edimburgo e iniciou a sua aventura pelos sete mares, segundo suas palavras. Trabalhou como grumete, no início, mas logo se tornou conhecido e respeitado como o médico de bordo. Anos depois, conseguiu ter seu próprio navio, por meios não convencionais, como frisou ironicamente, e passou a seguir suas próprias regras.
Nigel contou sua história, identificando-se com o velho pirata e sua origem.
Na quarta caneca de rum, o homem ainda parecia sóbrio e fez um convite a Nigel.
- Que tal fazer parte de minha tripulação? – perguntou Hawke ao final da conversa. – Sei que não é exatamente um trabalho honesto, mas estou precisando de um bom auxiliar no comando daqueles velhacos que me acompanham há vários anos. Meu contramestre aposentou-se no último embate que tivemos com um galeão que voltava abarrotado de ouro rumo a Espanha. Apesar de termos conseguido ficar um pouco mais ricos, meu velho amigo foi pego de surpresa por um mosquete inimigo. – Uma sombra de tristeza nublou sua face ao lembrar o fato. – Então? O que acha do meu convite?
- Aceito! – falou sem pestanejar. Caçado por Drake, certamente não conseguiria melhor função do que essa oferecida por Hawke.
E dessa maneira, Nigel Thomas Lodwick passou a navegar como braço direito do comandante do Highlander, uma caravela portuguesa, ágil e veloz, com cerca de trinta metros de comprimento, três mastros, um único convés e ponte sobrelevada na popa, velas latinas (triangulares) e equipada com oito canhões.

Com o passar do tempo, Brian Hawke tornou-se mais que um superior em comando. Tornou-se um amigo e um conselheiro de Nigel. Mostrou a ele o destino de parte de sua fortuna adquirida daqueles que, de uma forma ou de outra, pilhavam os nativos nas Américas e cobravam impostos exorbitantes em suas nações de origem. Hawke mantinha uma comunidade, na ilha de Eleuthera, que servia como abrigo para órfãos, crianças vítimas de naufrágios ou abandonados pelos próprios pais, o que era comum por aqueles lados das Caraíbas. O grande movimento de marujos e mulheres de vida fácil provocava essa triste situação. A pequena Aldeia do Falcão, como era conhecida, também servia como refúgio do pirata, para onde ele sempre voltava após suas aventuras pelos oceanos. Ao saber da existência de tal local, uma chama de esperança reacendeu em Nigel. A esperança de que Ana e sua mãe pudessem estar vivas num local como aquele. A lembrança dos grandes olhos tristes olhando para ele e a culpa por ter sido incapaz de ajudá-las ainda o perseguia.
Ao olhar para Nigel no comando de seu navio, Hawke idealizava o filho que nunca tivera. Um cavalheiro com as damas, um guerreiro audaz e forte nas batalhas e, ao mesmo tempo, um estudioso e excelente aluno, ao qual ensinou alguns de seus conhecimentos de medicina. Acabou por apelidá-lo de Crow, devido a sua astúcia, à cabeleira negra e ao próprio nome, que significava negro em latim.
Durante três anos navegaram juntos, dividindo alegrias, tristezas e pilhagens. Ao final desse tempo, durante um ataque a uma fragata holandesa, Hawke foi mortalmente ferido. Antes de morrer, transmitiu a Nigel sua herança, revelando-lhe a localização de sua fortuna e pedindo-lhe que continuasse a cuidar de seus órfãos e de seu refúgio. Revoltado com a morte de seu amigo e mentor terminou por saquear o navio e afundá-lo logo após. Nesse momento surgia o Capitão Crow, e o mau agouro representado pelo corvo era apenas contra os inimigos que ousassem enfrentá-lo.


 
(continua...)



A personagem do Cap. Brian Hawke é a minha homenagem ao pirata mais charmoso de todos os tempos, Errol Flynn, que viveu esse médico pirata no filme Contra todas as Bandeira, de 1952.
Prometo mais emoções no próximo capítulo.
Queria agradecer aos comentários dos meus amigos queridos que continuam me privilegiando com a sua presença aqui no blog, sempre me apoiando e incentivando. Muito obrigada, meus queridos!
Até a próxima semana! Beijos!














8 comentários:

  1. Ufa depois de tanto tempo consegui ser a primeira em postar... kkk

    Olha já estava quase me jogando no rio perto de casa para encontrar Nigel e salvá-lo de tantas coisas ruins...

    Mas logo eis que surge dos destroços de um naufrágio nosso Capitão Crow e com ele a esperança de um navio pirata justo e cheio de Romances ao Vento.

    Ai, mal posso esperar para saber quem será a sortuda da Elizabeth Swann (Keira Knightley) - Piratas do Caribe que vai comandar o coração desse capitão... kkk

    * * * Beijiskis* * *

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  2. Oi Rô!
    Adorei a homenagem a Errol Flynn e ninguém melhor que o Sean Connery para esse papel.
    Amiga, que pirata mais charmoso, até parece com um que a Roseli montou esses dias, rsrsrsr.
    Não vejo a hora de saber o que aconteceu com a menina e a mãe, em breve ela será uma mulher e fico aqui imaginando todas as emoções que nos aguardam nesse romance, acho que o Nigel vai ter um certo trabalho em conquistá-la, dadas as circunstâncias.
    Tô amando essa aventura e louca pra ler mais um capítulo.
    Beijosssss!!!!

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  3. Oi, Léia! Oi, Nadja! Que bom ter a companhia de vocês e saber que estão gostando dessa minha aventura romântica. Felizmente ou infelizmente, este romance tem mais a ver com os filmes antigos do que com os Piratas do Caribe. Fiquei com pena de acabar com o Hawke logo no início. Quem sabe um dia eu conte a história dele, não é? Quanto ao Crow, meu marido quando viu a foto, perguntou quem era a bicha? Pode? Tb acho que a foto poderia ser melhor, mas foi o melhor que eu pude fazer. O que acharam? Concordam com ele? kkkkkkk...É só para colocar uma pimentinha na imaginação.
    Quanto à musa do Crow, acho que a Nadja já pegou a ideia... Danadinha!
    Meus amores, muito obrigada pelos comentários. Espero não decepcionar vocês.
    Beijos!!

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  4. Oi!!!

    Estou adorando esta historia,e estou louca para ver o que vai acontecer com o bravo capitão Crow e qual será o seu destino como fora da lei.Adorei a homenagem que fez a Errol Flynn,,que era o ator que melhor personificou o pirata,atraente e viril e outro dia passou na TCM Capitão Blodd com ele.
    E tb só quero como vai ser o par romantico,deve ser uma moça bem danada como a Maureen O´Hara em Contra todas as bandeiras,que é tb um filme de capa e espada.
    Acho que não teve atriz mais bonita do que ela para fazer este tipo de filme.
    Estou esperando ansiosa pelo prox. cap.

    Bjs

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Oi, Cris! Que bom que estás gostando. Acho que tb vais gostar da minha heroína...Aguarde...
    Beijos, querida!

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  7. Ainda bem que o Nigel conseguiu o auxílio do Senhor krane, pois apesar da deserção não ser o melhor caminho a seguir, era o único meio que o Nigel estava encontrando para sair daquela situação tão horrorosa ao qual tinha se tornado sua vida ao lado do Drake. E o Krane foi muito bondoso e corajoso, pois se fosse pego nessa manobra, tb estaria frito!
    E o Capitão Brian Hawke... hehehe... Ai, esses escoceses tiram a minha paz!!!
    Esse encontro com o Capitão Brian foi uma tábua de salvação para o Nigel, ele pode refazer-se de todas aquelas intempéries que havia sofrido anteriormente, além de ter reacendido suas esperanças em reaver as mulheres que haviam sido entregues à própria sorte no mar.
    Oh, Rô... Que maldade... Olhar e não poder pegar... EU QUERO ESSE CAPITÃO CROW!!!!!!!! Parece-me conhecido o tal moço... hihihi... uma delícia hein...
    Beijinhos

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  8. Rose, to adorando Corsário Apaixonado!, Só mudaria o meu Capitão Crow do da foto!
    Aihn, será que a Ana está viva? será que os dois vão se encontrar depois de anos?
    Doida pra ler o próximo capítulo.
    Beijos Brih
    Meu Livro Rosa Pink

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Cantinho do Leitor
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