sexta-feira, 29 de julho de 2011

O Corsário Apaixonado - Capítulo IV



Sob os gritos de vitória e alegria dos embarcadiços por saberem que estavam regressando para casa, Crow retornou a sua cabine. Logo que entrou sentiu a brisa marítima bater-lhe no rosto e descobriu a janela aberta na popa. Procurou por Ana e não a viu. Soltou uma imprecação e correu até a abertura, procurando algum sinal dela no mar revolto logo abaixo. Não acreditava que ela fosse tão maluca a ponto de pular novamente. Olhou para os lados e descobriu que havia a chance dela ter conseguido andar através de uma estreita borda, onde apenas pés muito pequenos andariam, até bombordo e dali para um dos botes que usavam para descer em terra. Estaria tão desesperada para agir dessa maneira, enfrentando seus medos? Lutando contra o cansaço e a necessidade de confirmar suas suspeitas, voltou ao convés. Seria muito desagradável ter que tirá-la das garras de um de seus piratas. Mal tinha pisado no deck quando ouviu um grito feminino seguido por uma risada sarcástica. Ela fora capturada.
- Ora, ora, se não temos uma passageira clandestina...
- Me solte, seu nojento.
- Infelizmente vou ter que entregá-la para o capitão, mas antes... Que tal um beijinho? – disse o sujeito esticando o beiço repugnante e exalando um hálito de rum barato.
Foi seu erro prender-lhe apenas os braços, pois ela acabou por aplicar o mesmo golpe usado em Crow em seu primeiro encontro. Mesmo urrando de dor, o velhaco encontrou forças para levantar o braço e esbofeteá-la. Não fosse pela interferência de Crow que andou a largas passadas depois de localizar de onde vinham as vozes, ele teria batido novamente nela.
- Pare com isso, Bald! – ordenou, chamando-o por seu apelido. Os companheiros o chamavam assim devido a sua cabeça raspada que fazia questão de manter sempre livre dos ralos cabelos para, segundo ele próprio, impor "respeito" a seus adversários. Era dos seus mais antigos piratas. Anteriormente estivera a serviço de Hawke. Era um bom marujo, mas tinha dificuldades com a hierarquia no navio, além de beber sempre mais do que o limite tolerável.
O homem ainda um tanto atordoado pela dor em suas partes mais sensíveis, olhou com desdém para Crow.
- Deixe-me dar uma lição nela, Crow. Além disso, é uma clandestina!
- Não, Bald. Ela é minha convidada. Deixe-a comigo. Vá curar essa bebedeira na sua rede.
- Claro... E por que ela estava se escondendo num dos botes?
- É que ela gosta de brincar um pouco antes de ir para a cama... – explicou irônico, piscando o olho maliciosamente.
- Aaahh... Danadinha... – lambeu os lábios ressecados e piscou o olho de volta para Crow. – Então... Uma ótima noite.
Bald tratou de seguir a orientação recebida e saiu cambaleante, mais pela dor que pela embriaguez.
Antes que Ana pudesse fugir dele, Crow pegou-a pela cintura, estreitando-a junto ao seu corpo com força.
- Estou começando a cansar deste jogo de pega-pega que você resolveu inventar. – sussurrou para que ninguém os ouvisse.
- Aquele horroroso estava querendo me beijar, me bateu e você não fez nada? Ainda ficaram conversando como se fosse a coisa mais normal do mundo um homem bater em uma mulher? Fora as insinuações ao nosso respeito...
- Se você não calar a boca agora e vir comigo, eu mesmo vou lhe dar umas boas palmadas.
- Você não se atreveria...
Antes que ela continuasse, a mão aberta de Crow desceu com força e em cheio sobre seus glúteos, fazendo-a emitir um grito de dor e indignação.
- Acredita em mim agora ou quer que eu continue a demonstração?
Pela expressão fechada dele, Ana preferiu não arriscar a manter sua oposição.
Quando voltaram à cabine, começou a temer o que aconteceria durante o que restava da noite.
- Onde está Didier? – perguntou pelo único conhecido que tinha naquele navio e em quem, de uma maneira ou de outra, podia confiar ou, pelo menos, prever as ações.
- Por que quer saber?
- Pensei que ele dormiria aqui, é claro.
Crow sorriu. Ana estava com medo de ficar sozinha com ele no mesmo quarto. Seria possível que ainda fosse virgem? Tendo em vista o meio em que vivia em La Rochelle, achava pouco provável, infelizmente.
- Ele foi acomodado junto aos marujos que estão de folga. Não creio que você fosse se sentir à vontade no porão do navio, deitada em uma rede, cercada por homens que apreciam uma mulher disponível e de graça.
- Ora, seu grosso! – Elevou sua mão ao alto para bater no rosto de Crow, mas esse foi mais rápido e segurou-a antes que pudesse atingi-lo.
- Não precisa bancar a lady comigo. Sei muito bem onde vivia e, apesar da sua ascendência nobre, sei que aprendeu muita coisa nesses dez anos ao lado de um velho espertalhão como Didier. No entanto, não se preocupe. Não quero nada com você, a não ser achar uma maneira de devolvê-la a sua antiga vida, se isso ainda for possível... Vamos tentar dormir um pouco antes que o dia amanheça. Também deve estar cansada... Pode deitar na minha cama...
- Nunca!
- Eu dormirei no chão... Se permitir... – completou franzindo a boca para a direita com escárnio e fazendo uma reverência exagerada. – Amanhã, conversaremos melhor sobre o seu futuro. Boa noite, milady...
Ruborizada, ficou observando de esguelha Crow despir sua túnica e sua camisa, pegar um lençol e um travesseiro, apagar o lampião que os iluminava e deitar sobre o assoalho de madeira crua.
Tratou de deitar-se de roupa, temendo que Crow pudesse estar apenas fingindo e que, quando estivesse despreocupada, atacasse. Sabia como os homens podiam ser traiçoeiros. Como se enfeitiçada, passou a admirar o torso de músculos definidos e fortes, iluminado pelo luar que invadia o quarto e que era a única luz de que dispunha para manter-se atenta aos seus movimentos. Entretanto já não era apenas o temor de um ataque sexual que a levava a observá-lo e sim a curiosidade. Sua respiração era tranquila e um leve ressonar a fez imaginar que ele dormira. Subindo o olhar para seu rosto, prendeu um suspiro, ao deparar-se com o perfil masculino delineado pela luz prateada, as sobrancelhas espessas, o nariz grande e proporcional ao conjunto... Como ele seria sem a barba?
- Não está dormindo? – a voz grave quase a fez cair da cama, tal o sobressalto sofrido.
Ela ficou muda. Mais pelo susto que por medo. Teria ele se dado conta que o observava da cama?
- Por que tem tanto medo do seu tio espanhol? – continuou, apesar do silêncio dela – Estavam fugindo dele quando seu navio foi interceptado por Drake?
- E por que esse seu interesse? Como sabe de tanta coisa a meu respeito? – finalmente ela respondeu com voz firme, voltando a pensar na sensação de já conhecê-lo.
Passaram-se alguns segundos, em que Crow refletiu em como responderia à pergunta.
- Um amigo que serviu ao comandante Drake me contou sua história alguns anos atrás. Quando Didier me narrou a maneira como encontrou você, liguei os fatos, confirmados ao ver a mancha em forma de coração em seu pescoço.
- Muito observador esse seu amigo, não? Contou até sobre a minha marca de nascença... – Pode sentir certa tensão no ar após esse comentário. – Então você tem este tipo de amigos, que matam inocentes e jogam mulheres e crianças ao mar para a morte. – continuou ferina.
Era o que ele temia. Ela jamais acreditaria que ele tinha sido contra aquele ato desumano ou que sua deserção fora decorrente deste fato. Jamais o perdoaria.
- Ah! Ainda quer que confie em você... – Neste instante notou a expressão que misturava consternação e culpa.
- Nem todos que estavam a bordo naquele dia concordaram com o que Drake fez. – replicou buscando absolvição.
- Se não concordavam, por que deixaram acontecer? – Sua voz tornou-se trêmula pela profunda tristeza que sentia ao relembrar o dia em que perdeu sua família, sua alegria e sua inocência. A suspeita de que Crow estivera presente naquele fatídico dia se fortificava, mas por algum motivo não queria acreditar naquilo.
- As coisas nem sempre são o que parecem. – Sua resposta e sua postura pareciam carregar um pesado fardo – Drake era o comandante e os outros eram seus subordinados.
- Por que não me deixa em paz? – Não queria que ele percebesse as lágrimas que começavam a molhar sua face e encolheu-se agarrada à colcha que tinha sobre a cama.
Sufocado pela culpa, não disse mais nada. Ouvir aquelas palavras dos lábios de Ana acresceu ainda mais o sentimento que mantivera adormecido por quase dez anos.
O silêncio voltou a reinar no ambiente, envolto em mágoas e culpas passadas.

Ao acordar na manhã seguinte, depois de lembrar onde se encontrava, Ana voltou-se rapidamente para o canto em que Crow dormira. No entanto, o lugar estava vazio. Olhou em volta e não viu sinal dele. Levantou-se e foi até a mesinha onde se encontravam uma bacia de fina porcelana e uma jarra de água. Soltou os cabelos e teve o cuidado de certificar-se que estava totalmente só. Mal tinha acabado de se lavar, com rosto e mãos limpas, ouviu duas batidas fortes na porta da cabine. Seu coração acelerou, mas logo foi acalmado ao ver a figura conhecida de Didier.
- Bom dia, Marie... Ou devo chamá-la de Dona Ana? – disse enquanto olhava em volta sorrindo, mostrando a falta de alguns dentes na boca, comparando o lugar em que ele dormira com o conforto daquele ambiente. – Ora, ora... Vejo que foi tratada com luxos... O mesmo não aconteceu comigo. Vou ter que reclamar meus direitos, afinal sou seu pai.
- Deixe de falar tolices... E você não é meu pai.
- Olhe aqui, sua mal agradecida. Gastei meu tempo e meu dinheiro para mantê-la por quase dez anos. Agora que tem a chance de melhorar de vida, não vai me desprezar.
- Não vejo nenhuma melhora de vida presa nesse navio pirata. Além disso, só para lembrá-lo, quem o sustentou nos últimos anos fui eu. Fui obrigada a ir para as ruas e aprender a roubar para poder comer e ainda ter que dividir o que conseguia com você. Portanto, não me venha com essa de pai preocupado com meu sustento.
- Eu devia tê-la deixado para morrer naquela praia ao lado de sua mãe, sua ingrata.
Ela emudeceu tristonha e humilhada ao lembrar o passado.
- O que está acontecendo aqui? – interferiu Crow que entrou na cabine carregando uma bandeja a tempo de ouvir a última frase dita.
- Uma pequena discussão familiar, senhor – respondeu Didier aborrecido, frisando pejorativamente a palavra senhor.
- Por que não vai tomar seu café com os homens lá no convés?
- Por que ela pode ter regalias e eu não? Afinal ela é minha filha adotiva e eu o ajudei a tirá-la da prisão.
Crow largou calmamente a bandeja sobre a mesa do gabinete e olhou-o com súbita frieza.
- Se continuar reclamando vou mandar cortar a ração extra que ordenei que lhe dessem e colocá-lo a trabalhar como todos os outros neste navio, lavando o convés ou descascando batatas na cozinha.
Didier soltou um palavrão e saiu irritado batendo a porta.
- O que ele queria?
- Apenas ver como eu estava. – respondeu em voz baixa.
- E essa é a maneira dele demonstrar preocupação?
- Ele apenas está querendo levar alguma vantagem sobre a nova situação. Não é um mau homem.
- Não é mau, mas vem explorando você todos esses anos.
- Como ele disse... Poderia ter me deixado morrer, como fizeram os heróicos marujos de Sir Drake – alfinetou-o mais uma vez e conseguiu seu intento plenamente.
- Trouxe seu café. Bom apetite. – voltou-se e seguiu o caminho de Didier para fora.
Arrependeu-se por ter sido grosseira com ele ao olhar a bandeja servida com frutas, pão e... uma xícara de chá! Fora delicado da parte dele servi-la daquela maneira e ela mostrara-se uma completa estúpida. Como estava morrendo de fome, sentou-se na cadeira em frente à escrivaninha onde ele deixara a refeição e devorou tudo, admirando a qualidade do chá servido. Há muito tempo não tomava um desjejum ou qualquer outra refeição como aquela. Crow não devia ser tão mau assim, ou tentava ser simpático para esconder suas verdadeiras intenções. Certamente ele estava em busca de um rechonchudo resgate por ter achado a herdeira perdida do Duque de Villardompardo. Infelizmente levaria a pior, já que seu tio não gostaria de vê-la tão saudável. Pensando assim, de repente sua expressão anuviou-se ao imaginar se o tio não pagaria para que ele se livrasse dela. Não duvidava que ele aceitasse uma oferta como essa, afinal não passava de um pirata. Encheu-se de horror e agradeceu aos céus por ele ter cedido na intenção de ir à Espanha atrás de Villardompardo. Imaginou se Crow saberia a respeito de seu tio inglês? Sua mãe, antes de falecer, quando ainda estavam à deriva no bote, falara sobre seu irmão que morava na Inglaterra. Classificou-o como severo, mas uma boa pessoa. Tinha sido contra o casamento dela com seu pai, mas aceitara recebê-los em sua casa, em Basildon, quando soube dos motivos de sua volta à casa dos Boyle. Contudo, agora, depois de tantos anos, não sabia nem se o tio ainda estava vivo ou se a aceitaria como sobrinha. Provavelmente se recusaria receber a filha de Ramon Villardompardo, que casara com sua irmã a despeito de seus conselhos em contrário. Cansada de pensar em seu futuro incerto, decidiu sair da cabine e dar uma volta. Precisava enfrentar o seu medo e respirar um pouco de ar fresco. Talvez isso despertasse novas ideias de como resolver sua atual situação.
Prendeu os cabelos e colocou-os escondidos sob um barrete que achou entre os pertences de Crow. Ajeitou as roupas como se fosse um rapaz. Olhou no espelho e gostou do resultado.
Abriu a porta devagar, olhou para os lados e deixou a cabine. Andou pelo corredor até a escada que a levaria para o convés sem encontrar ninguém. Quando viu as velas estufadas, içadas nos mastros altos e a visão do horizonte onde apenas o mar e o céu se encontravam, sentiu uma leve tontura. O balanço do navio iniciou uma ponta de náusea na boca de seu estômago. Esperava que aquilo logo passasse. Andou até a amurada próxima, começando a chamar a atenção de alguns dos piratas. Ergueu os olhos e viu a figura imponente de Crow na ponte, junto ao timoneiro e a um dos homens que a ajudara na fuga. Brett? Era esse o seu nome, não? Pensou.
- Dormiu bem, formosa? – perguntou uma voz desagradavelmente desconhecida – O Crow não pareceu ter ficado muito satisfeito com as suas brincadeirinhas de ontem à noite. Acordou muito mal humorado hoje... – conjeturou Bald, para cair na gargalhada logo depois.
O asco, pela maneira sórdida do velho falar, só fez aumentar o desconforto de Ana.
Olhar para as ondas que batiam furiosas no casco do navio à medida que se deslocavam, não melhorou o seu enjoo. Colocou uma mão sobre o estômago e a outra sobre a amurada. Não resistindo mais, curvou-se com a cabeça para fora e eliminou seu fabuloso café da manhã. A risada em volta foi instantânea. Acostumados com a vida em alto mar, achavam engraçado quando alguém passava mal como ela. Mesmo furiosa com o tipo de atenção que estava recebendo, não conseguia parar com as arcadas que iam e vinham. Repentinamente as risadas cessaram e um braço envolveu sua cintura. Sentiu um pano umedecido em sua testa e a voz reconfortante de Crow se fez ouvir.
- É melhor voltar para a cabine.
- Eu já estou bem – falou com voz contida, tentando afastar-se dele. Não sabia se tremia devido ao mal estar ou se pelo calor que invadiu seu corpo com a proximidade do pirata.
- Está branca e trêmula como uma folha de papel. Vamos!
Não gostava de ser mandada, principalmente por alguém como ele que desde que conhecera parecia querer ser dono do seu destino. Por isso tentou afastá-lo novamente.
- Nunca vi ninguém tão teimosa quanto você! – disse entre dentes e levantou-a no colo como se fosse uma criança, caminhando na direção de seu camarote.
Fraca demais para reagir, deixou-se levar sob protestos verbais, dignos de Didier.
- Quer calar a boca, por favor? – solicitou ele com a voz tão doce que a fez calar no mesmo instante.
A porta se fechou atrás deles. Seus olhares se encontraram e por um momento suas bocas se aproximaram tanto que os lábios quase se roçaram. Com a respiração descompassada, Ana lutava contra a vontade de passar os braços em torno do pescoço forte e tenso a sua frente. Como seria aprofundar os dedos naqueles fartos cabelos negros? Sentir aqueles lábios tocarem os seus?
- Não havia necessidade de me pegar no colo – falou quase num sussurro, tentando recobrar a razão e a solidez do corpo, que se perderam sob o olhar e os braços de Crow.
- Você estava mal... – Lutava entre o desejo de beijá-la e a vontade de lhe dar uma advertência rígida, por ter saído do quarto sem permissão. – Além disso, precisava mostrar à tripulação a quem você pertence.
- Como assim? Pertenço? – perguntou indignada mais uma vez. O encanto se quebrara. – Quer me largar?
Recuperado do instante anterior, irritou-se consigo mesmo pela perda temporária do bom senso e largou-a no chão, quase a deixando cair.
- Pronto! Já larguei!
- Que história é essa de mostrar à tripulação a quem eu pertenço? Está muito enganado se...
- Olhe aqui, mocinha. Você ficará em meu navio por cerca de duas semanas, com trinta homens a bordo, sendo a única mulher aqui. O risco de alguém tentar assediá-la é grande. Portanto, ficará mais segura se estes homens pensarem que é minha mulher. Entendeu? Ou quer que eu repita em francês?
Crow queria protegê-la... Era isso?
- Não... – falou envergonhada por ter pensado mal dele. – Não precisa repetir... Eu entendi.
- Portanto, não saia da cabine sem mim. – disse arrependido por ter gritado com ela e amenizando o tratamento empregado – Por favor.
Sacudiu a cabeça, chateado, e foi até um pequeno guarda-louça atrás da escrivaninha. De lá tirou um vidro transparente que continha uma espécie de tubérculo. Pegou uma faca, tirou o espécime de dentro do vidro e cortou um naco pequeno.
- Tome e mastigue. Vai fazer você se sentir melhor do enjoo.
- O que é? – perguntou desconfiada olhando com nojo para o estranho bocado, de cheiro exótico, que Crow lhe oferecia.
- Não se preocupe. Ainda não estou pensando em envenená-la. – falou com seriedade, para logo em seguida sorrir e tranquilizá-la. – É gengibre, uma raiz cultivada na Índia. Tem um sabor um tanto picante, mas acho que vai gostar.
Dizendo isso, voltou para o seu posto de comando. Antes de fechar a porta pode ouvir uma imprecação de Ana, maldizendo o gosto intragável do gengibre cru.
- Mastigue, se não quiser continuar vomitando o resto da viagem! – aconselhou-a, segurando o riso.

- E então, Brett? Como estamos? – perguntou ao voltar para a ponte de comando.
- Estamos muito bem, pelo que sugere o seu bom humor. Conseguiu acalmá-la?
- Dei um pedaço de gengibre para ela mastigar.
Brett soltou uma gargalhada.
- Do que está rindo? É um ótimo remédio para enjoo.
- Poderia deixá-la ao menos fazer um chá daquilo, ao invés de mandar mastigar puro.
- Achei que assim ajudaria a calar a sua boca também. – Começou a rir juntamente com seu imediato e amigo – É incrível, mas ela consegue dizer mais palavrões do que muito marujo por aí.

Quando a piada perdeu a graça, Brett resolveu sondar Crow.
- Aqui entre nós, o que deu em você para trazer esses dois a bordo? O tal Didier é um tremendo folgado. Ela é bonita demais para ficar passeando no convés, atiçando os homens. Além disso, sabe como eles podem ser supersticiosos, achando que uma mulher a bordo pode trazer azar.
- Não se preocupe. Vou mantê-la na cabine fora da vista deles.
- Ainda não me disse quem são e por que os trouxe para cá.
- Pena.
- Pena? Como assim?
- Ela foi presa por ter roubado o Chefe da Milícia de La Rochelle e seria decapitada hoje. Fiquei com pena e por isso a tirei de lá. O pai veio por ter ajudado na fuga.
- E desde quando você virou um bom samaritano?
- Desde que eu vi o belo par de pernas por baixo daquelas calças. – mentiu, com um sorriso matreiro, piscando o olho direito.
- Ah! Esse é o meu velho Capitão Crow! – rindo aliviado, deu uma palmada nas costas de seu companheiro de aventuras.
Crow gargalhou também, mas em seu íntimo sentiu-se traindo Brett por não contar seus motivos reais e sobre a identidade de Ana. Mesmo sendo amigos há tantos anos, era melhor não envolvê-lo naquela questão. Talvez lhe revelasse a verdade quando chegassem a Eleuthera. Por enquanto seria melhor assim.

- Por que você mentiu o seu nome? – decidiu perguntar após o silêncio torturante que se prolongara desde o jantar até o momento em que ficaram a sós no quarto e ele se deitou no chão, como na noite anterior. Crow não voltara para vê-la depois do ocorrido pela manhã. Brett foi quem levou suas refeições, tendo falado apenas o cordialmente necessário.
- O quê?– interrogou de volta, surpreso com a pergunta repentina de Ana, na escuridão do quarto.
- Você me disse que seu nome era Nigel. Esqueceu? – Apesar de tentar parecer casual, seu coração estava em vias de saltar do peito. Sentia-se nervosa com sua presença e presumia que isso fosse pelo medo de ser atacada por ele.
- Meu nome é Nigel. Crow é meu apelido. – Esperava que ela continuasse o interrogatório, pois gostava de ouvi-la quando não estava blasfemando. Nesses momentos sua voz era meiga e tinha um leve e sensual sotaque francês.
- Que apelido mais estranho...
- Se não gosta, pode me chamar de Nigel.
- Que lugar é esse para onde estamos indo?
- É uma ilha nas Caraíbas.
Silêncio.
- Você é inglês, não é?
- Sim.
- Então porque não vive na Inglaterra?
- Tenho meus motivos.
- E eles têm algo a ver com as cicatrizes das suas costas?
- É melhor dormirmos. – disse ele secamente, interrompendo o interrogatório. Era melhor que ela permanecesse ignorante quanto ao seu passado. Talvez, depois de devolvê-la a sua verdadeira família em segurança, contasse a sua história e como seus destinos haviam se cruzado dez anos antes. Talvez ela o perdoasse...
Ana entendeu que as cicatrizes haviam machucado não apenas a pele de Nigel, mas seu orgulho e sua alma. Por isso, não insistiu nas perguntas e calou-se. No silêncio reprimiu não só as palavras, mas também a desconfiança e a vontade de saber mais sobre aquele estranho protetor, de consolá-lo e de abrir seu coração. Fechou os olhos e sacudiu a cabeça, tentando afastar mais uma vez esse tipo de bobagens do pensamento.

(continua...)


Sexta-feira!! Dia de postagem!  A situação entre esses dois está tensa...  
Queria agradecer de coração os comentários da Nadja, da Aline e da Lucy e a todos que me acompanham nessa viagem no navio pirata do Capitão Crow. Meu agradecimento sincero também à minha querida amiga Briana, a Leitora, do blog Meu Livro Rosa Pink, que está postando partes dos capítulo deste romance e do Pelo de Punta no seu espaço, sendo de uma ajuda inestimável para a divulgação do Romances ao Vento e de minhas histórias.
O próximo capítulo já está no forno...rsrsrs
Até a próxima!
Beijos!!













6 comentários:

  1. Ai Rô, que lindo amiga!!
    O romance está cada vez mais envolvente, e o Nigel é um verdadeiro cavalheiro. Fez com que me lembrasse dos romances que eu lia na infância e que me fizeram acreditar em príncipes e princesas.
    Espero que as cicatrizes possam ser levadas em conta na hora em que Ana descobrir a verdade, tadinho, ele já sofre tanto com a culpa, meu coração ficou apertado a cada alfinetada que ela deu nesse capítulo... dá pra imaginar o olhar tristonho dele e toda a ansiedade que deve estar sentindo na presença dela, o medo de não ser perdoado. Sinto que ainda vou chorar e suspirar muito nos próximos capítulos amiga, ai, ai.
    Estou amaaaando esse romance, ele é um presente!
    Parabéns por esse dom!
    Beijos amiga querida!!!

    ResponderExcluir
  2. Oi, Rosane?

    Primeira vez que visito seu blog, que legal, Ro!
    Está muito interessante essa história, já estou adorando.
    Vou acompanhar!

    Beijos

    ResponderExcluir
  3. Rosane: adorei esse capítulo! Aliás, estou adorando o romance todo... Sinto como se estivesse lá, com a brisa do mar em meu rosto e o lindo pirata navegando pelo oceano bravio. Ai, ai... Está de parabéns, amiga. Bjos.

    ResponderExcluir
  4. AHH não acredito que vou ter que esperar a próxima postagem?! to adorando o livro Rose!é muito bom.
    super ansiosa pela continuação.
    Beijos
    Briana
    Meu Livro Rosa Pink

    ResponderExcluir
  5. Coitada da Ana, os seus pensamentos confusos deviam estar fazendo verdadeira bagunça em sua cabeça. O que pensar quando o Crow mostrava saber o que lhe havia acontecido, mas de outro lado, também demonstrava sinais de delicadeza a ela? A vida lhe havia sido muito dura, ela está certa em ficar com um pé atrás e muito atenta a tudo.
    Nossa, a Ana vai ter que fingir que é a mulher dele por duas semanas... Bom, confesso que seria uma ótima atriz e aceitaria ‘fingir’ ser a mulher dele sem problema algum... hehehe...
    Gengibre é bom para enjôo? Eu não sabia. Tenho esse problema por vezes, então sempre tomo remédio quando viajo, pois prefiro me precaver porque ficar enjoada é ruim demais, acaba com a viagem e com o dia. Contudo, o remédio dá moleza, nunca tomei calmante, mas ele me faz ficar sonolenta, com o pensamento meio lento. É bom saber que na hora do enrosco, vou poder contar com o gengibre.
    Duas semanas juntos é bastante tempo para se conhecerem melhor, para o Crow quebrar as barreiras de desconfiança que a Ana tem a respeito dele. O negócio é ele ir se abrindo, continuar com o cavalheirismo para que ela se sinta mais confortável ao seu lado, afinal, confiança é algo que se conquista!
    ♥Beijinhos♥

    ResponderExcluir
  6. Esse pirata está cada vez mais irresistível... quem ñ gostaria de estar no lugar da Ana, que por sinal está se saindo muito bem.

    * * *Beijão* * *

    ResponderExcluir

Cantinho do Leitor
Este cantinho está reservado para que coloquem suas críticas a respeito de meus romances e do blog. A sua opinião é muito importante para mim. Se tiverem alguma dificuldade em postar aqui, deixem mensagem na caixa de recados.
Beijos!